 O Marques de Casa Concha e seu novo filho
A gigante chilena Concha y Toro (CyT) sempre teve uma atuação destacada no mercado brasileiro. Impossível entrar em algum supermercado sem encontrar o Reservado, a linha básica da vinícola. Assim como é impossível examinar a mente de um enófilo requintado e não encontrar, no escaninho Objetos de Desejo, os ícones Don Melchor e Almaviva.
Por um longo período, a CyT foi representada no Brasil pela Expand, à época a maior importadora de vinhos do nosso mercado. E a Expand trazia todos os vinhos de sua parceira, à exceção do Casillero del Diablo. Reza a lenda urbana que, devido à grande religiosidade de Otávio Piva de Albuquerque, proprietário da importadora, a referência ao Belzebu no nome do vinho era o motivo para tal omissão.
Quando iniciou a surpreendente derrocada da importadora, a CyT anunciou os planos para um vôo solo, montando sua própria distribuição nas terras tupiniquins. Foi impossível, para todos os apreciadores da bebida não relacionar um fato ao outro. Mas Alfonso Larraín Santa María, presidente da vinícola, nega peremptoriamente tal associação, explicando que uma mudança desse porte necessita de um período de gestação bastante longo e tudo não passou de mera coincidência. E completa dizendo que a Expand permanecerá como parceira, inclusive continuando a vender a linha da CyT para o consumidor final. Quem viver, verá!
Essas explicações foram dadas durante o almoço que a vinícola ofereceu no restaurante Fasano al Mare, em Ipanema, para apresentar o mais novo rebento da prestigiada linha Marques de Casa Concha: o Carmenère 2007, que vem se juntar aos outros três tintos (Merlot, Syrah e Cabernet Sauvignon) e ao único branco, o Chardonnay.
Há cerca de 2 anos eu era um consumidor compulsivo dessa excepcional linha, principalmente por que eu conhecia o caminho das pedras: enquanto a Expand vendia esses vinhos por cerca de 80 e poucos reais, eu os comprava na Sendas do Largo da Machado por 57 reais, lembro bem! Depois, os vinhos sumiram do supermercado, a claudicante Expand deixou de fazer parte dos meus hábitos de consumo, e eu meio que esqueci de como esses vinhos eram tão bons. Com isso, foi uma alegria e tanto reencontrar a família reunida e aumentada nesse fantástico almoço.
Os nobres vinhos do Marques são elaborados, há 10 anos, por Marcelo Papa (foto ao lado), escolhido como o Enólogo do Ano, em 2007, pelos Cronistas Gastronômicos do Chile. São vinhos concentrados, complexos e com muito fruta, que consistentemente arrebatam altas avaliações da crítica internacional. O novo Marques de Casa Concha Carmenère 2007 tem tudo para seguir seus irmãos de sangue nessa trajetória de sucesso. Elaborado com uvas provenientes do vinhedo Peumo, no Vale de Cachapoal, de onde provém igualmente os ícones Carmin de Peumo e Terrunyo Carmenère, ele está muito bem acompanhado! Segundo seu enólogo, "possui uma grande estrutura e um potencial de guarda considerável... onde a barrica proporciona deliciosos toques de chocolate e baunilha."
Mas para mim, o Marques de Casa Concha Syrah 2007 roubou a cena do irmãozinho mais novo. Um vinho escandalosamente inebriante, é um corte de 92% Syrah, 3% Cabernet Sauvignon, 4% Carmenère e 1% de Cabernet Franc - deve ser cerca de meio cacho. (É bom esclarecer aqui que todos os tintos dessa linha são sempre cortes que variam de ano para ano!) Os aromas eram florais, com especiarias (canela, principalmente) e foram evoluindo na taça - o pouco tempo em que o vinho ficou por lá - e acenando com muita complexidade. Na boca, os taninos eram doces, maduros, e o vinho se prolongava em toda a sua potência e deliciosidade! Não foi a toa que a safra 2005 foi considerada como o melhor Syrah pelo Guia de Vinos de Chile.
Mas a alegria não parou por aí: durante o almoço que se seguiu à degustação, o Marques de Casa Concha Chardonnay 2007 deu um show! Com 11 meses de barricas francesas, tinha tanto frescor e tanta fruta que eu poderia jurar que havia pelo menos algum percentual que não houvesse passado por madeira. Qual o quê! Tudo passa por madeira, mas a integração é tanta e a elegância é tão sutil que a gente até duvida!
Para finalizar, conto que Paula nos informou que esses vinhos - o branco e os tintos - devem chegar ao consumidor final por 80 reais. Valer, com certeza vale. E é um pouco menos do que a Expand cobrava há 2 anos, mas é bem mais do que o meu mocó do Largo do Machado me permitia dispender. Mas eu venderia minha alma ao Casillero se a Sendas voltasse a ter ofertas tão boas quanto antigamente!
Oscar Daudt |