 Natal Branco
Quando a Confraria Vai Dar Certo, da ABS, convidou-me para um almoço, na Brasserie Rosário, só com vinhos brancos eu já gostei, pois ando numa fase - duradoura, diga-se de passagem - em que tenho apreciado muito mais a diversidade de aromas e estilos que esses vinhos oferecem. Os rótulos seriam surpresa, mas em conhecendo essa confraria, já sabia que não iria me decepcionar. No entanto, nem nos meus mais descontrolados devaneios poderia imaginar a festa para os sentidos que foi esse encontro.
Tivemos espumantes de entrada, os vinhos para harmonizar com o regabofe, alguns vinhos piratas levados pelo Duda Zagari, da Confraria Carioca, mas a grande sensação foram os 4 vinhos servidos na degustação que precedeu o almoço.
Digamos que o menos surpreendente dos 4 tenha sido o Viña Tondonia Gran Reserva Blanco 1981, pois em se tratando dessa vinícola, 1981 é vinho jovem. Basta dizer que a safra mais recente desse vinho, que está em comercialização é a de 1987, que eu já havia degustado e que é elaborada com Viura e Malvasia. Portanto, não pude evitar de balançar na cadeira ao saber que a esse vinho branco 1981 é elaborado com 85% de Tempranillo e 15% de Malvasia (*). Com aromas bem evoluídos, oxidados, porém com notas cítricas e mel, o vinho surpreendia com uma boca bem seca e com jovial acidez. É um vinho que o produtor recomenda servir entre 16-18°C e em um teste às cegas, eu nem piscaria para dizer que se tratava de um jerez. Bacana!
Se o vinho anterior me balançou na cadeira, o seguinte me estatelou no chão: era um branco argentino, da Lagarde, elaborado com 100% Sémillon e sabem de que safra? 1942!. Bem, a história desse vinho é a seguinte: quando os novos proprietários da Lagarde lá chegaram, encontraram um tonel de 1800 litros com essa preciosidade. Esse vinho - considerado o branco mais velho da América Latina - foi engarrafado em 1990 e é agora vendido a preço de ouro: 800 pesos argentinos (algo como 400 reais) quando comprado lá. De novo, em estilo jerez, os aromas revelavam nozes e até algumas notas de abacaxi. Na boca, intenso e cheio de especiarias. Como quem importa a Lagarde é a Reloco, procurei no site e vi que eles não trazem esse vinho para cá. Portanto, se você ficou curioso, só mesmo buscando em Buenos Aires - e deixando as calças por lá!
Saindo das antiguidades, partimos para dois grandes ícones. O primeiro era um Château Haut-Brion Blanc 2004, que era uma aula de elegância. Elaborado com Sémillon e Sauvignon Blanc, é definido pelos produtores como os aromas de um Sauternes encapsulados em um vinho seco. O nariz era delicado, com flores, nêsperas e cítricos, antecipando uma boca de excelente acidez, duração e intensidade. Custa cerca de 300 dólares em Nova Iorque, portanto não quero nem pensar quanto deve custar por aqui, se é que existe.
Encerrando a degustação, veio a cerejinha do bolo: um Etienne Sauzet Bâtard-Montrachet Grand Cru 2006, que era estupendo. Proveniente de um vinhedo liliputiano, de 0,14ha - fala sério! - o vinho era tudo de bom e foi o meu preferido do almoço, da semana, do ano, da vida... Exageros à parte, era verdadeiramente magnífico com seus aromas de flores brancas, mel, lichia e nozes prenunciando um boca fresca e de grande intensidade. Imagino esse vinho daqui a uns 5 anos!
Depois de provar essas inesquecíveis raridades, almoços prá quê? Mas não posso deixar de falar da excelente dupla que fizeram o chef Frederic Monnier e Roberto Rodrigues, orientador da confraria, na elaboração do cardápio e na harmonização dos pratos. Confiram só as fotos do almoço e fiquem babando...
Oscar Daudt
(*) - Esse corte é a informação que consta no site da Viña Tondonia, mas Roberto Rodrigues me alertou que ele está incorreto e essa safra é também um corte de Viura e Malvasia. |