 O milagre no meio do deserto
Com um grupo de enófilos, capitaneado pelo dinâmico Germán Alarcon, da SBAV/MG e do Zênithe Travel Club de Belo Horizonte, participamos de uma viagem enogastronômica à cidade de Mendoza e arredores. Dentre outras atividades, fizemos visitas com degustação em sete vinícolas, almoços com degustação em quatro vinícolas, jantares harmonizados, etc... Procurarei descrever e inserir algumas fotos de alguns desses eventos.
Antes de mais nada, não é demais mencionar que Mendoza é uma cidade situada aos pés da Cordilheira dos Andes, no oeste argentino e sua população situa-se pouco acima de 110.000 habitantes. O trabalho do homem conseguiu converter uma região desértica em um paraíso verdejante e arborizado, graças ao planejamento, trabalho e à irrigação.
No centro da cidade, as ruas e avenidas são sombreadas por árvores de grande porte, graças às "acequias", canais de irrigação que podem ser vistas em todas as calçadas, por onde corre permanentemente a água procedente do degelo na Cordilheira.
A Argentina atualmente é o 5º maior produtor mundial de vinhos que, em sua maioria provém de Mendoza, privilegiada por fatores como o clima extremamente seco, que propicia uma maturação perfeita com um mínimo de tratamentos fitossanitários, os vales localizados em grandes altitudes, o solo pobre em nutrientes, a pureza da água usada para a irrigação, etc... Em Mendoza, a precipitação média anual é de apenas 250mm, o que pode ser comparado favoravelmente com importantes regiões vinícolas do mundo, como o Vale de Napa com 600mm e Bordeaux com 900mm. Mas existe um problema: a região é sujeita a quedas de granizo, que em poucos minutos podem destruir uma safra!
A variedade Malbec se adaptou de forma tão extraordinária a esse terroir, que desenvolveu características muitíssimo distintas e superiores às que apresenta em sua região de origem, que é Cahors, na França.
Breves comentários sobre as visitas
O Clos de los Siete é um empreendimento idealizado por Michel Rolland em 1999, com a parceria de seis viticultores bordaleses. Foi implantado em Vista Flores, 110 km ao sul de Mendoza, no vale do Tunuyan, a 1100 m de altitude, em uma área de 850 hectares. 50% das uvas lá cultivadas são da variedade Malbec, ficando o restante dividido principalmente entre Merlot, Cabernet Sauvignon e Syrah.
Cada produtor pode engarrafar seus próprios vinhos, mas uma parte da colheita se destina à produção do blend que leva o nome do empreendimento. É o vinho Clos de los Siete que considero um dos melhores que degustei durante a viagem. Recebeu 92 pontos do Wine Advocate em 2007.
Outro projeto muito interessante, também no Vale do Uco, é um condomínio de vinhedos iniciado em 2005, chamado The Vines of Mendoza, que possibilita ao amante do vinho converter-se em um pequeno produtor de vinhos de classe. O condomínio, com um total de 900 acres (372 hectares) foi dividido em parcelas de 3 a 10 acres; ao adquirir uma dessas parcelas, o proprietário decide o que e como vai produzir, contando em todas as fases com o apoio de agrônomos e enólogos liderados pelo renomado viticultor Santiago Achaval, que orientam e acompanham todo o processo.
A média anual de dias de sol lá é de 330 e a amplitude térmica média é de 18 graus centígrados.
Para grande surpresa minha, o proprietário de um desses lotes, onde fomos recebidos, era nada menos que um ex-colega de trabalho de uma indústria siderúrgica onde exerci atividade. Deu à seu empreendimento o sugestivo nome de Clos de los Gaúchos. (Para quem desejar mudar de vida, informo que ainda existem alguns lotes disponíveis para venda no projeto.)
Em nossas andanças, visitamos estabelecimentos de todo porte, desde as pequenas como Atamisque e Gimenez Riili, passando por Vistalba, Achaval Ferrer, a tradicional Norton, até a imponente Bodega Salentein, verdadeira catedral do vinho.
Na Norton, alem da visita e degustação, participamos de uma aula de culinária regional, onde preparamos, sob orientação da chef Mariana Toledo, entre outros pratos, as famosas empanadas de carne mendoncinas, assadas em forno de barro. E, creiam ou não, ficaram excelentes.
Melhor do que as palavras, as fotos ilustram alguns desses momentos.
Paulo Mazeron é engenheiro, enófilo e ex-presidente da SBAV-RS |