
Gregory Hecht saiu sério na minha foto, o que em nada reflete seu espírito durante a apresentação dos vinhos Hecht & Bannier, pela importadora Vinci, no Bazzar de Ipanema.
Ele e seu sócio François Bannier iniciaram, há menos de 10 anos, um empreendimento vinícola no Languedoc copiando o modelo borgonhês: decidiram se tornar "négociants éleveurs", na primeira experiência desse tipo no sul da França. E o que é exatamente isso? Eles não têm vinhedos e nem estrutura de vinificação, mas apenas uma cave de envelhecimento, e a cada ano visitam centenas de produtores da região comprando os melhores vinhos que encontram. Uma vez os vinhos comprados, eles testam inúmeros cortes (de castas e de vinhedos), escolhendo o que consideram o melhor e deixam amadurecer em madeira até atingir o estágio de comercialização.
Realmente é um esquema interessante. Sem ter um só pedacinho de terra nem um pé de videira, eles conseguem elaborar vinhos com as mais importantes denominações do Languedoc-Roussillon: Minervois, Saint Chinian, Côtes de Roussillon Villages e Faugères. São os vinhos da linha que eles chamam de Les Crus. E ainda há outra linha mais simples, da nova denominação Languedoc, em que produzem um branco, um rosé e um tinto. Mas é um negócio, pura e simplesmente, e todo aquele discurso de paixão e mão-na-terra, tão usual entre os diversos produtores que nos visitam, vai por águas abaixo.
Depois de tantas e tantas apresentações em que os preços vão à estratosfera, é alentador conhecer uma gama de vinhos cujas etiquetas variam de 38 a 110 reais (consumidor final). E são vinhos cantados e decantados pela imprensa especializada internacional, que sempre foca na excelente relação custo x benefício da empresa.
Iniciamos com um H&B Rosé Languedoc 2009, 100% orgânico, cuja cor escura levou um gaiato a perguntar: "Só para eu me atualizar: estamos bebendo um rosé ou um tinto?". Fresco, seco e fácil, com teor alcoólico de 12,5% - insolitamente baixo para os dias de hoje - foi exatamente o objetivo dos produtores: fazer um vinho para se beber distraidamente nas tardes ensolaradas do Languedoc.
Já o H&B Minervois 2007 era bem mais sério, elaborado com a predominância de Syrah e temperado com Grenache, Carignan e Mourvèdre. O envelhecimento deste vinho, no entanto, mais parece um processo acadêmico de pesquisa, com partes do vinho passando em aço, barricas de 400 litros (de 2 anos e de 3 anos), barricas de 225 litros (novas, de 1 ano, de 2 anos e de 3 anos) e ainda uma parcela em cascos. Durma-se com um envelhecimento desses! Mas o vinho é aveludado, fresco e gastronômico, fazendo com que o produtor se deixasse levar pelo entusiasmo e recomendá-lo para harmonizar com peixes. Felizmente o Bazzar não seguiu seus conselhos... Mas seu preço de 78 reais o torna uma excelente opção para harmonizar as carnes de nossos jantares.
Em sequência, o H&B Saint Chinian 2008, mais uma vez muito Syrah com pequenas partes de Grenache e Mourvèdre, opulento e macio, fresco e mineral, com aromas de frutas maduras e canela, era outro vinho com bastante harmonia e pronto para encarar o pato confit que nos foi servido. Com honrosos 92 pontos de Robert Parker e seus honestíssimos 90 reais na caixa registradora, é quase 1 real por ponto... Barganha!
Finalmente, a cerejinha do almoço: o portentoso H&B Faugères 2003, deliciosamente evoluído, mas ainda apresentando muita fruta e bela estrutura tânica, com um nariz complexo de trufas, terra e condimentos. Era o vinho mais caro do dia - 110 reais - e mesmo assim perfeitamente cabível dentro dos bolsos daqueles que buscam um grande vinho para aquecer as refeições suculentas de nosso inverno.
Oscar Daudt |