
Ao ser apresentado à bela representante do Château Gruaud Larose, com seu charme tipicamente francês, fiquei surpreso ao ouvir seu irrepreensível português e não pude deixar perguntar como ela podia falar assim tão bem nossa língua, sem transformar todas as palavras em oxítonas. "Eu sou mineira, de Pouso Alegre", ela esclareceu.
Maisa Mansion vive há 8 anos na França, onde foi apenas fazer um curso de hotelaria e não mais voltou. Estagiou em destacados hotéis, fez curso de sommelière e atualmente é a responsável pelo enoturismo do Château. Conforme ela nos contou, os châteaux de Bordeaux sempre foram muito avessos ao turismo, mas os tempos mudaram, a necessidade apertou, e atualmente muitos deles oferecem atrações aos visitantes. No caso do Gruaud Larose, um 2ème Cru Classé de Saint Julien, são diversas as atividades propostas aos enófilos, desde uma visita guiada com degustação, por 8 euros, até uma vertical do primeiro vinho das safras 2000, 1996, 1989 e 1983, por nada módicos 150 euros. Durante a colheita, o turista pode aproveitar um programa especial de visita em que se pode compartilhar o almoço no castelo com o pessoal da colheita.
Perguntei se havia hospedagem e Maisa disse que esse era um projeto que ela tinha proposto, mas que por enquanto ainda não havia sido aprovado.
Vertical de Gruaud Larose |
Fundado em 1725, pelo abade Gruaud e pouco depois herdado por Joseph-Sébastien de Larose, o château deles ganhou seu nome. Após pular de mão em mão por diversos proprietários, dentre eles a improvável multinacional Alcatel, finalmente em 1997 foi comprado por uma família que tem uva até no nome, os Merlaut, proprietária de diversos châteaux na região. Apesar de toda essa turbulência, Gruaud Larose é uma das poucas propriedades de Bordeaux que conserva exatamente os mesmos hectares que possuía na época da histórica classificação de 1855.
Seus vinhos são ao mesmo tempo poderosos e elegantes, elaborados com predominância de Cabernet Sauvignon, seguida de perto por boas doses de Merlot e, complementando o espectro, leves temperadas de Cabernet Franc, Malbec e Petit Verdot. O château prefere envelhecer seus vinhos por 18 meses em barricas de tostagem média, para que a madeira apareça discretamente e não se sobreponha à fruta.
Harmonizados com um caprichado jantar definido por José Grimberg, iniciamos provando o segundo vinho da vinícola, o Sarget de Gruaud Larose 2005, numa sempre impressionante garrafa magnum, com um corpo médio e muita maciez, no nariz encanta com aromas de cedro, café e frutas negras.
Em seguida, a tão esperada vertical, apresentada - acompanhando os pratos - na ordem 2006, 2004 e 2005. Maisa explicou que 2004 foi uma safra complicada, sobrepujada por um ano de 2005 que chegou com força total. Apresentar o vinho de 2004 após o do ano seguinte só faria com que ele desaparecesse nas taças e, portanto, ela preferiu alterar a natural sequência cronológica. E, realmente, a safra 2005 era um espetáculo, com um nariz de frutas maduras, temperado com notas florais e minerais, antecedendo um corpo denso, cheio de força, condimentado e de interminável permanência.
É claro que esse luxo todo vem com uma etiqueta amarga pendurada no gargalo. Não são vinhos para qualquer um - notadamente não para mim - custando de 400 reais (safra 2006) até 598 reais (safra 2005). Mas enquanto eu estava pensando que ninguém pagaria preços assim tão assustadores, eis que um amigo presente ao jantar - e que eu propositadamente omito o nome para que ele não corra risco de sequestro - pediu uma garrafa de cada, inclusive da magnum do segundo vinho. Como é bom ter amigos assim, pois ele prometeu convidar-me quando fosse fazer sua própria vertical.
Oscar Daudt |