
Em setembro último um grupo da Confraria do Camarão Magro cumpriu um roteiro enoturístico pela Alemanha. A primeira cidade em que ficamos foi Munique, onde o domínio é das cervejas. Há um grande número de cervejarias espalhadas pela cidade, cada uma oferecendo as "louras" e "morenas" produzidas por uma das seis grandes produtoras locais: Augustinerbräu, Hofbräuhaus, Paulaner, Spatenbräu, Hacker-Psachorr e Lowenbräu.
Rumando para o norte, desfrutamos meio dia na imperdível e medieval Rothenburg-ob-der-Tauber (www.rothenburg.de), à margem da Rodovia Romântica (Romantischestrasse). Vários de nós nos deliciamos com os Schneeballenträume (sonhos de bola de neve), típicos da cidade.
Fomos nos hospedar em Würzburg, ainda no Estado Federal da Baviera, mas uma das principais cidades da região da Francônia (Franken). Esta é uma região vinícola importante; uma das características dos seus vinhos é a garrafa achatada Bocksbeutel, semelhante à do vinho português Mateus Rosé. Seus vinhos brancos são principalmente das cepas Muller-Thurgau, Silvaner, Bacchus, e também Riesling. Há tintos das cepas Portugieser (nada a ver com Portugal) e Domina. Os vinhos que provei não me impressionaram, preferi os Rieslings do Pfalz, do Mosel e do Rheingau.
Da Francônia, rumamos para o Palatinado (Pfalz), para os arredores da Estrada do Vinho (Weinstrasse). Chegamos a Bad Dürkheim, ao meio-dia de um domingo, último dia da Wurstmarkt, a maior feira de vinhos da Alemanha, apesar de a palavra wurst significar salsichas e linguiças (www.duerkheimer-wurstmarkt.de). Diferentemente do que havíamos imaginado, essa feira é um grande parque de diversões para o povo! Além da roda-gigante, trem-fantasma, etc... há muitas dezenas de pequenos pavilhões dos produtores de vinhos (brancos) da região, cada um vendendo seus vinhos a granel, em canecas de 0,5 litro(!) e muitos quiosques com salsichas, linguiças, frangos, porquetas, carrés e joelhos de porco, etc...
No Pfalz, está a mais extensa região vitícola do país. Seus mais renomados rótulos provêm das vinícolas situadas ao longo da Weinstrasse, especialmente dos vilarejos de Bad Dürkheim, Forst, Deidesheim e Wachenheim. Fomos muito bem recebidos em uma manhã na Weingut Dr. Bürklin-Wolf (www.buerklin-wolf.de), em Wachenheim. Visita completa, com degustação, conduzida em inglês. Tanto nesta como nas demais vinícolas que visitamos, a vindima estava se iniciando naquela segunda quinzena de setembro.
Fugindo da complicada classificação dos vinhos alemães, este produtor usa na sua lista de preços e em alguns rótulos as letras G.C. (Grand Cru) e P.C. (Premier Cru) para diferenciar seus vinhos superiores, bem como apenas a palavra Qualitätswein nos contra-rótulos ao invés de Q.M.P.
Na degustação - gratuita - foram-nos servidos Rieslings de 2009 e 2010: 2 bons genéricos (10 euros), 2 P.C. muito bons com indicação do vilarejo e dos vinhedos e 6 meses de barricas (17 euros), 2 ótimos G.C. com indicação dos vinhedos (em Forst - o melhor terroir) e 9 meses de barricas (37 euros) e 1 ótimo Auslese (40 euros). Eu aproveitei para comprar um top de linha: Forster (melhor vilarejo) Jesuitengarten (melhor vinhedo) Fass 63 (melhor tonel) Riesling 2003, 13% de álcool, Qualitätswein (61 euros). Esse mesmo vinho consta no catálogo da Mistral por US$149,50.
À tarde visitamos a vinícola Reichsrat Von Bühl, em Deidesheim (www.reichsrat-von-buhl.de). Visita completa, com degustação (21 euros por pessoa), conduzida em alemão com tradução simultânea em português (por um funcionário lusitano).
Na cave, foram-nos servidos: um Sekt Brut de Riesling 2007 (15,50 euros), um Sekt Rosé Brut 2009, de Spätburgunder (Pinot Noir) (14 euros), e um Spätburgunder 2008 Qualitätswein (24 euros), todos muito bons. No salão degustamos: um Grauburgunder QbA 2010 (pinot gris) (8,50 euros), um Riesling QbA 2010 (8,50 euros), um Pechstein Forst Riesling Grosses Gewächs 2009 (29 euros) e um Ungeheuer Forst Riesling Grosses Gewächs 2009 (29 euros) do qual gostei muito.
Havia na lista também - mas não nos serviram - um Ungeheuer Forst Riesling Beerenauslese 2010 (240 euros). Informaram-nos que a vinícola passará a ser representada no Brasil pela Importadora Decanter.
Rodamos a seguir para Bernkastel-Kues, no Vale do Mosela (Mosel). São duas cidadezinhas unidas por uma ponte sobre o Mosela. Kues é maior e nela está o Weinmuseum e a Vinothek; Bernkastel é mais turística e muito encantadora.
Este é o centro do maior vinhedo contínuo da Alemanha - 90% Riesling. A região é linda, pois o Mosela é muito sinuoso, percorrido por barcos de turismo e as encostas muito inclinadas que o margeiam são cobertas por vinhedos. Estes situam-se sempre nas encostas voltadas para o quadrante sul e, devido à sinuosidade do rio, estão ora na margem esquerda ora na direita. O solo da região é xistoso/ardósia, com as raízes das vinhas penetrando no solo a até 12 metros; e a colheita é tardia, desde o final de setembro até 6 de dezembro - festa de São Nicolau.
Pela manhã fomos recebidos em frente ao histórico portão da Doctorkellers (cave) pelo marido da proprietária/herdeira da Weingut Witwe Dr. H. Thanish (www.dr.thanisch.de). Como a sede da empresa fica em Kues, a degustação (gratuita) ocorreu na própria cave, conduzida em francês. Essa cave fica no interior de uma encosta com grande aclive dominando o vilarejo de Bernkastel, e sua história de mais de 350 anos confunde-se com a da região e mesmo da Alemanha. A vinícola tem 12 ha de vinhedo de Riesling nessa encosta com uma pequena porção de Pinot Noir.
Uma característica dos vinhos do Mosela é o seu baixo teor alcoólico. Degustamos: um Thanisch Riesling Classic 2009, 12% de álcool (7,80 euros), um Bernkasteler Badstube Riesling Kabinett 2010, 9% de álcool (9,50 euros), um Berncasteler Doctor Riesling Kabinett 2009, da parcela de maior prestígio, com 9,5% de álcool) (20 euros), um Brauneberger Juffer-Sonnenuhr Riesling Spätlese 2009, com 8,5% de álcool, (14 euros), um Bernkasteler Lay Riesling Auslese 2007, 10% de álcool, (25 euros) e um Wehlener Sonnenuhr Riesling Beerenauslese 2006, 8% de álcool (55 euros). A vinícola não tem representante no Brasil mas procura importador.
À tarde visitamos a Weingut Selbach-Oster, em Zeltingen (a 7 km de Bernkastel) (www.selbach-oster.de). Aí fizemos apenas a degustação (10 euros por pessoa), conduzida em inglês por um dos proprietários. Provamos os seguintes vinhos, todos Zeltinger: Sonnenhhr Riesling Kabinett Trocken 2009, 12,5% de álcool, Schlossberg Riesling Spätlese Trocken 2007, 12,5% de álcool, Himmelreich Riesling Kabinett halbtrocken 2010, Schlossberg Riesling Kabinett 2010 (9,5 %), o mesmo vinho 2001 (8,5 %), Sonnenuhr Riesling Spätlese 1993 (8,5 %), e o Sonnenuhr Riesling Auslese 2010 (7,5 %) que eu comprei. Infelizmente os ótimos 1993 e 2001 estavam esgotados. Alguns deles constam do catálogo da Importadora Vinci. Aproveitei a estada para comprar também vinhos de outros bons produtores da região: Dr. Loosen e Joh. Jos. Prüm.
Em seguida dirigimo-nos à região do Rheingau, no Estado Federal de Hessen. Visitamos o antigo mosteiro cisterciense Kloster Eberbach, de 1345, que tem uma coleção de grandes e primitivas prensas de vinhos onde era o imenso refeitório dos monges. O mosteiro é cercado por vinhedos, todos pertencentes a uma fundação que é também produtora de vinhos. A visita, conduzida em inglês, terminou com uma degustação de 9 vinhos do Rheingau, em sua cave iluminada por velas e ainda repleta de grandes tonéis vazios; vinhos médios, finalizados com um ótimo Beerenauslese.
Fomos hospedar-nos poucos quilômetros adiante, na encantadora Rüdesheim-am-Rhein. A cidade, situada no meio dos vinhedos, é o mais popular centro turístico da região. Há várias ruas pontilhadas por bares de vinhos que oferecem provas dos seus diversos Riesling. Há ainda um teleférico que se desloca sobre os vinhedos até o Memorial de 1871, no alto da encosta, com esplêndida vista de toda a região.
Aguinaldo Aldighieri é enófilo, associado da ABS-RJ e ex-Presidente da Confraria do Camarão Magro. |