
Cristiana Beltrão, proprietária do Bazzar, esteve recentemente na Sicília, mezzo passeio, mezzo trabalho. E enquanto experimentava os vinhos da região, ia anotando no caderninho aqueles que considerava os melhores para serem incluídos em sua carta. Na verdade, a carta de vinhos do Bazzar é assinada, há 13 anos, por Célio Alzer, da ABS, mas ele provou e aprovou as aventuras independentes de sua pupila, durante um excepcional almoço que - acreditem - começou exatamente ao meio-dia. Nem parecia Rio de Janeiro...
O primeiro branco trazido por Cristiana, foi um show inigualável, destaque-mor de um almoço que primou pela qualidade de seus vinhos: o Benanti Pietramarina Etna Bianco 2003. Sim, é 2003, mas nem lendo o rótulo a gente acredita, pois é um vinho de acidez elétrica, cítrico, com forte caráter mineral, cremoso, com muita fruta, e que vai evoluindo, evoluindo, evoluindo... na taça. É elaborado com 100% Carricante, uma uva que existe apenas na região do vulcão Etna e é plantada a 950 metros de altitude. Não é um vinho barato, infelizmente, e é vendido na importadora por 210 reais. Mas é uma incrível oportunidade no restaurante, que o está oferecendo por 219 reais, só 9 a mais!!! O vinho é estupendo e se você está com a carteira cheia, eu recomendo de olhos fechados, boto a mão no fogo e dou a cara a tapa! (E alô, alô, Cristiana e Nicola: este vinho não passa por madeira!)
Mas da carta siciliana, o vinho que faz o maior sucesso de vendas é o Tasca d'Almerita Nozze d'Oro 2009, um corte de Inzolia (78%) com Sauvignon Tasca (um inédito clone de Sauvignon Blanc), com boa acidez e deliciosos aromas de pêssego. Mas o sucesso não decorre das inusitadas castas, mas sim da história de amor que vem engarrafada, pois é uma criação do Conde Giuseppe em homenagem à sua querida Franca, nas comemorações das bodas de ouro do casal. Custa 142 reais.
O terceiro branco, também especialíssimo, foi o Planeta Cometa Bianco 2009, elaborado com 100% de Fiano, apresentando aromas de frutos tropicais, bastante corpo e longa duração. E aqui temos uma situação comercial inédita: na importadora esse vinho custa 155 reais e o restaurante o está vendendo por - pasmem! - 136 reais!
Depois de brancos tão entusiasmantes, os tintos chegaram sem que eu levasse muita fé. Mas eu estava enganado. Os dois sicilianos da carta também merecem a atenção pela qualidade e exotismo. Mas cuidado, não são vinhos para qualquer salário mínimo!
O primeiro deles tem um nome tão longo - Tenuta delle Terre Nere Etna Rosso Prephylloxera La Vigna di Don Peppino 2009 - que quando você termina de pedir, a comida já esfriou. E eu deixo para Cristiana descrevê-lo: "A cratera que fica a mais de 3.000 metros de altura me espiava da janela do hotel apontando minha absoluta insignificância. Plantar vinhos num vulcão não é para investidores, mas para apaixonados. Com uma breve mudança de humor, lá se vão plantações, pesquisas e vidas. Mas a tentação é inevitável e a região mais promissora da atualidade é disputadíssima pelos viticultores sicilianos. Os vinhedos são os mais altos da Europa. Seus vinhos, feitos com as uvas Nerello Mascalese e Nerello Cappuccio, rainhas do Etna, são constantemente equiparados aos melhores Pinots da Borgonha. E com uma vantagem: são vinhas do fim do século XIX, originais de uma época pré-filoxérica. Obteve a cotação máxima do Gambero Rosso e do Duemillavini." E o preço? 384,60 reais.
E, finalmente, com o sedutor nome de Donnafugata Mille e Una Notte 2005, elaborado com 100% de Nero d'Avola, a mais conhecida das castas sicilianas, é um vinho elegante, fresco, com toques de chocolate e muitas especiarias. E, apesar de caro, é mais uma vez uma barganha: custa na importadora 335 reais, enquanto o Bazzar o está oferecendo por 323,50 reais. Nada mal!
O prazer de uma refeição no Bazzar vai bem além da esmero das receitas, primorosamente apresentadas, da criatividade e da gostosura dos pratos. O que diferencia as obras a quatro mãos do chef Cláudio de Freitas e de Cristiana é a qualidade dos ingredientes, sempre apresentados com certidão de nascimento e carteira de identidade.
A primeira entrada, por exemplo, um refrescante copo de Feijão Santarém com Tartare de Tomates vem com o cartão de embarque da viagem do Pará para o Rio.
O surpreendentemente belo Carpaccio de Pato com Queijo de Cabra e Tomilho - que mais parece um colorido bolo de rolo - não é para qualquer pato, nem para qualquer queijo e muito menos para qualquer tomilho. O palmípede vem de Sapucaia, o queijo é da Fazenda Genève e a erva é plantada na Fazenda Cafundó. É doc, doc, doc...
E o Prime Rib com Purê de Batata e Alho vem enfeitado com a marca mais registrada do restaurante: a deliciosa e única Farofa de Focaccia, temperada com bacon, passas e tomilho. Tão boa que mereceria ter uma linha no cardápio só para ela, não como coadjuvante, mas como atriz principal.
As sobremesas também são um espetáculo, só que eu não provei...
Oscar Daudt
12/02/2012 |