
Você fica sabendo que o Brasil entrou no rol das maiores economias do planeta, quando 80 importantes Châteaux de Bordeaux desembarcam, de mala e cuia, no Rio de Janeiro para apresentar a safra 2009 de seus vinhos, como que revivendo as Invasões Francesas do século XVI!
Enquanto a imprensa anunciava o fato de o Brasil ter passado a rasteira na Grã-Bretanha, deslocando-a da posição de 6ª economia mundial, uma caravela da Air France aportava no Galeão, lotada de ávidos produtores, enólogos e negociantes - todos de olho nas receitas do pré-sal - carregando suas sacolas cheias de espelhinhos e de cobiçadas garrafas.
No marketing de luxo, os franceses são imbatíveis e um verdadeiro frenesi tomou conta dos enófilos cariocas, com algumas semanas de antecedência, na expectativa de uma degustação assim inédita. Houve gente que veio dos mais distantes estados para participar da festa e eles certamente não se arrependeram do esforço, pois - vamos combinar! - não é só no marketing que os franceses dão as cartas: eles também sabem fazer grandes vinhos!
O evento foi extremamente confortável, com a quantidade de convidados compatível com o número de expositores, sem aglomerações e atropelos, não havendo dificuldades em se provar o vinho que se quisesse, com muito espaço e tempo suficiente para receber as atenções dos representantes dos châteaux, muitos deles até bastante solícitos, contrariando a fama de mal-humorados dos franceses.
"A melhor safra dos últimos 60 anos!", "Safra brilhante e suntuosa!", "A melhor safra que já provei até hoje!". Essas são apenas algumas das exclamações com que a imprensa internacional canta e decanta o resultado de 2009 em Bordeaux. Condições climáticas especialíssimas, perfeitas para a região, levaram os críticos especializados a não pouparem elogios aos recém-chegados vinhos bordaleses.
Eu que imaginava ter de enfrentar a dureza de uma safra recente demais, fiquei surpreendido pela maciez, a elegância e o requinte da quase totalidade dos rótulos que degustei. No total, provei 3 espetaculares brancos de Graves e mais 16 tintos de diversas denominações. Claro que nem passei pela frente dos estandes de Sauternes.
Os vinhos que encheram minhas taças exibem etiquetas que variam de 25 a 354 dólares - nos Estados Unidos, é claro! - e iam do maravilhoso ao sublime. Os três brancos eram fantásticos, mas aquele que mais me fez a cabeça foi o Smith Haut-Lafitte, vinho de acidez vibrante, cremoso, complexo... Um show! Mas enche de emoção os corações e as mentes ter a oportunidade de provar o Château Pape Clément, um branco que papou 100 pontos de Robert Parker. Ô maravilha! Mas é bom não se entusiasmar muito com a perspectiva de experimentá-lo pois, se ele custa 237 dólares nos Estados Unidos, imaginem quanto não deve custar por aqui...
No terreno dos tintos, apesar das gritantes diferenças de preços das amostras, era difícil encontrar algum que não agradasse. Mas, coincidência ou não, o mais deslumbrante deles era também o mais caro dentre os que eu provei: o Château Angelus - que custa em média 354 dólares nos Estados Unidos - apresenta expressivos taninos aveludados, um fundamento de muita fruta e uma persistência inigualável.
Ainda caro, mas bem mais em conta - cerca 115 dólares no primeiro mundo - para beber o Château Rauzan Ségla, apesar de seu rótulo horroroso, que remete a vinhos de garrafão (desenhado pelo estilista Karl Lagerfeld), bastava fechar os olhos e esquecer o continente para se deliciar com o excepcional conteúdo, de textura sedutora, com opulência, concentração e frescor.
Em conversa com uma produtora, ela me disse que a safra 2010 promete ser tão boa quanto foi a de 2009. Portanto, para quem já está com saudades do evento de ontem, é só esperar mais 12 meses para nos rendermos à próxima invasão francesa em 2013...
Oscar Daudt
09/02/2012 |