
Os leitores mais desatentos podem até pensar que eu fui participar de armações políticas com o presidente do PT. Nada mais incorreto, pois o jantar, a convite de A Essência do Vinho, era mesmo com o homônimo do político, Rui Falcão, um dos mais importantes críticos de vinho de Portugal.
Enquanto o Rio de Janeiro se afogava em uma chuva torrencial e a cidade sofria, mais uma vez, o transtorno das águas mal-cuidadas, o pequeno grupo de convidados - e bota pequeno nisso! - desfrutava de um dos mais deliciosos jantares dos últimos tempos. Rui selecionou alguns vinhos marcantes da enologia portuguesa para nos oferecer e para minha alegria - coisa rara nesses eventos - havia mais vinhos brancos do que tintos. Foi uma festa para esses tempos estivais.
Melhor do que os vinhos e a gastronomia, só mesmo as informações que Rui nos passava a respeito de cada rótulo. Não sei se isso acontece com os leitores também, mas para mim, saber da história e das curiosidades, torna os vinhos ainda melhores!
Eram todos excelentes vinhos, mas os mais inesquecíveis foram:
Quinta da Bágeiras Pai Abel Branco 2010 |
Na edição 2012 de seu Guia de Vinhos, Rui teve a ousadia de escolher como "Vinho do Ano" de Portugal, um vinho branco! E mais surpreendente ainda, com origem na Bairrada, região quase que desconhecida para vinhos dessa cor: era o Quinta das Bágeiras Garrafeira Branco 2009. Mas desta vez, o crítico nos apresentou outro vinho branco dessa mesma vinícola, o Quinta das Bágeiras Pai Abel Garrafeira Branco 2010. Apesar do acento no A, os portugueses pronunciam o nome da quinta como "bagêiras" e desta vez a ousadia foi minha ao corrigir os donos da língua ensinando o que deveria ser a pronúncia correta. Muita cara-de-pau minha!
Corte de Maria Gomes e Bical, é um branco elaborado por essa vinícola-boutique, de forma tradicional. O vinho é pisado em lagares e amadurece por um ano em barricas pequenas usadas. Com marcante mineralidade e aromas de pêssego, é um vinho de grande estrutura, poderosa acidez, cremoso e que promete revelar grandes e deliciosas surpresas para quem tiver a paciência de esperar para consumí-lo daqui a alguns anos.
Quem importa este vinho é a Premium Importadora, mas infelizmente eles não contam qual o preço.
Buçaco Branco Reservado NV |
Para quem viaja à Bairrada, a visita ao Palácio de Buçaco é quase obrigatória. Construído pelos últimos reis de Portugal, ao final do século XIX, é uma obra que parece retirada dos mais delirantes contos de fadas, com arquitetura cheia de rococós, jardins de grande beleza e situada em meio a um parque nacional. Pois é nas caves desse palácio que eram feitos os vinhos "da casa". Atualmente, eles são elaborados fora de lá, mas continuam com a mesma reputação que desfrutam desde 1920.
Como o palácio (atualmente um hotel) fica situado na divisa entre a Bairrada e o Dão, serve-se de uvas das duas regiões para elaborar seus vinhos que, com isso, são classificados como vinho de mesa e nem podem exibir a safra em seu rótulo. No entanto, igual a um jeitinho brasileiro, eles colocam um pequeno adesivo informando aquilo que o consumidor quer saber. O vinho que provamos era de 2007, mas não contem para a ViniPortugal!
O belo rótulo que mostra o imponente palácio é o original de 1920 e traz a palavra "Reservado", o que pela legislação portuguesa não quer dizer absolutamente nada! Mas Rui apressou-se em explicar que isso não era oportunismo - tipo alguns Reservados chilenos - pois quando o rótulo foi criado, nem existia uma regulamentação.
Elaborado com as castas Bical e Encruzado ou Maria Gomes, apresenta uma elegância invejável, uma acidez deliciosa, flores e cítricos no nariz, prolongando-se na boca por um bom tempo...
Esse vinho é importado pela Mistral e a safra 2005 custa salgados 236 reais.
O Pintas é um dos gigantes do Douro, elaborado pela dupla Sandra Tavares e Jorge Seródio, no Pinhão. É um vinho suntuoso, deliciosamente floral e, como descreve Rui, com fruta madura e indecorosa, seja lá o que isso for. Um sonho de consumo dos apreciadores. Por isso, nunca imaginei testemunhar esse vinho fazendo reverências a uma realeza maior, muito maior, que foi o alentejano que o seguiu.
Atualmente, o Pintas está na carteira da Adega Alentejana que, no entanto, não informa o preço em sua página.
O grande campeão: Quinta do Mouro Rótulo Dourado 2005 |
Há poucas semanas ofereci a alguns amigos o Quinta do Mouro 2005, vinho que havia comprado em Lisboa, e que encantou a todos e a mim também. O vinho era tão espetacular que fiquei surpreso em saber que ele não era o rótulo mais importante da casa, honraria que cabe àquele que é conhecido como Quinta do Mouro Rótulo Dourado. Pois foi exatamente esse o vinho que Rui apresentou no jantar e que, incontestavelmente, ocupou o pódio de melhor vinho da noite, da semana, do mês...
A vinícola localiza-se nos arredores de Estremoz e seu proprietário é, surpreendentemente, um dentista. No entanto conta com o auxílio luxuoso da consultoria do famoso enólogo Luis Duarte. Rui Falcão não hesita em classificá-los como os melhores do Alentejo todo. E notem que sua mulher é enóloga de diversas vinícolas por lá... Corte de Alicante Bouschet, Aragonês, Touriga Nacional e Cabernet Sauvignon, é um vinho grandioso, surpreendente, arrebatador, ao mesmo tempo possante e de extrema elegância. De agradecer a Deus!
É um vinho caro até mesmo em Portugal (65 euros na Garrafeira Nacional) e não faço a menor ideia de quanto deve custar por aqui, visto que sua importadora, a Épice, é mais uma que não informa seus preços.
Oscar Daudt
07/03/2013 |