
A região de Beaujolais virou refém de seu próprio sucesso. Só para se ter uma ideia, em 1960, a produção girava em torno de 2 milhões de garrafas ao ano. 30 anos depois, em 1990, a quantidade de garrafas anuais havia crescido para estonteantes 90 milhões. E tudo isso, graças a uma bem bolada estratégia de marketing - lembram do "Le Beaujolais nouveau est arrivé!"? - que inundou os mercados internacionais com esse vinho frutado e festivo.
É claro que ninguém consegue multiplicar sua produção por 45 vezes, em 30 anos, impunemente. E a qualidade dos vinhos deixou de ser um preocupação para muitos produtores que buscavam apenas aumentar suas vendas, surfando no inquestionável sucesso do Beaujolais Nouveau.
Mas a onda começou a passar e, pelo menos aqui no Brasil, a chegada dos Beaujolais Nouveaux é recebida com indiferença pelos consumidores. A novidade se foi mas deixou duas marcas indesejáveis associadas ao nome: vinhos de pouca qualidade e que devem ser bebidos apenas na 3ª quinta-feira de novembro.
Mas Beaujolais não é apenas esse fenômeno mercadológico e atualmente a região luta para se mostrar ao mundo como produtora de bons vinhos com alguma capacidade de guarda. Afora os Nouveaux, os vinhos tradicionais são divididos em 3 categorias, em ordem crescente de qualidade:
Beaujolais: o básico, com uvas plantadas na parte sul da região, onde a terra é mais fértil;
Beaujolais Villages: com uvas provenientes de 39 cidades da parte central;
Crus de Beaujolais: de 10 cidades localizadas na parte norte, onde estão as montanhas graníticas nas quais a uva Gamay melhor se adapta - Brouilly, Chénas, Chiroubles, Côte de Brouilly, Fleurie, Juliénas, Morgon, Moulin-à-Vent, Régnié e a romântica Saint-Amour; dessas 10, as mais bem reputadas são Fleurie, Moulin-à-Vent e Morgon, que possuem capacidade de envelhecer até por 5 anos.
Muito embora sejam autorizadas - sempre em pequenas quantidades - as castas Aligoté, Chardonnay, Melon, Pinot Gris e Pinot Noir, na prática os tintos de Beaujolais são quase que totalmente elaborados com a estrela Gamay (também conhecida como Gamay Noir à Jus Blanc).
A grande surpresa para mim foi saber da existência - e provar - do Beaujolais Branco. A bem da verdade, não era só eu, e toda a torcida do Fluminense também desconhecia essa versão. O produtor Louis Tête explicou a razão de tanto anonimato: "Os vinhos brancos são elaborados com a Chardonnay e a Aligoté, mas constituem apenas 1% de toda a produção e, portanto, raramente são exportados."
Os vinhos de Beaujolais sempre foram conhecidos como os "únicos vinhos brancos que por acaso são tintos", devido a seu caráter floral e frutado e sua capacidade de aliviar a sede dos bebedores. E Rogério Rebouças, o representante da região no Brasil, quer embarcar nessa onda: "Apesar de nosso clima, os brasileiros surpreendentemente preferem os vinhos tintos e é difícil mudar esse padrão. O que nós queremos, já que se bebe tanto tinto por aqui, é que os consumidores escolham um vinho leve, frutado e refrescante, que deve ser servido gelado e é bastante adequado aos trópicos."
O jantar de apresentação dos vinhos aconteceu no Le Pré Catelan, e o chef Roland Villard contou com a parceria de seu conterrâneo Christian Têtedoie, dono do estrelado restaurante homônimo na cidade de Lyon e uma espécie de embaixador dos vinhos de Beaujolais. Foi uma noite para guardar com carinho na memória. O encontro teve como objetivo primordial apresentar a Rue des Beaujolais, uma série de atividades de divulgação da marca que acontecerá, este ano, aqui no Rio de Janeiro. Essa mesma festa começou em 2011, em Lyon, passou por Nova Iorque em 2012 e agora chega a nossas calorentas praias.
A programação é ambiciosa e promete converter os cariocas em novos amantes desses vinhos. Vejam só alguns exemplos do que irá acontecer por aqui, nos dias 20 e 21 de novembro:
Festa de lançamento do Beaujolais, na Lagoa Rodrigo de Freitas;
Entronização de personalidades na Ordem dos Companheiros de Beaujolais;
Lançamento do Beaujolais Nouveau em bares e restaurantes;
Encontros interprofissionais;
Ateliers culinários para harmonização de pratos franceses e brasileiros com os vinhos Beaujolais, contando com a presença de importantes nomes da enogastronomia, como Deise Novakoski, Frédéric Monnier, Olivier Anquier, Roland Villard, dentre outros, e destacando-se o chef Christian Têtedoie, presidente dos Cuisiniers de France;
Show musical com artistas franceses e brasileiros;
Leilão beneficente de grandes vinhos da região;
Festa aberta no Leblon, com degustação de vinhos.
Para os cariocas, o discurso dos produtores está prontinho e afiado e não deve ser complicado conquistar nossos corações e mentes. O que me pareceu ser uma tarefa bem mais árdua, na verdade, foi saber que em 2014 as comemorações ocorrerão na distante Moscou. Em novembro, aquela cidade tirita com temperaturas negativas todos os dias e acho que será bem mais difícil convencer os moscovitas a beber um vinho leve e geladinho.
Oscar Daudt
10/08/2013 |