
A Rede Windsor de hotéis, carioca da gema, que parece crescer a cada dia, até recentemente não prestava muita atenção aos restaurantes de suas unidades. Até que, no final de 2011, ao assumir as rédeas do antigo Le Meridien - rebatizado como Windsor Atlântica - decidiu apostar na alta gastronomia e inaugurou o Alloro, buscando ninguém menos do que o chef Luciano Boseggia para tomar conta dos fogões. A guinada culinária deu tão certo que a rede pegou o gostinho.
E desta feita, ao reinaugurar um repaginado Hotel Miramar, também de frente para o mar de Copacabana, apostou bem alto. O hotel está belíssimo, com uma decoração requintada e de extremo bom gosto. E de novo, um restaurante de causar oh!s de admiração. Embora o hotel esteja de frente para a Avenida Atlântica, sua entrada ficou na rua lateral, a Sá Ferreira. E isso porque a disputada frente para o mar ficou reservada, inteiramente, para os janelões de vidro que iluminam o restaurante Sá. Simplesmente Sá, homenageando a rua.
E para mexer as panelas, convidou um expoente da nova geração de chefs cariocas.
O nome escolhido foi o de Paulo Góes, cuja carteira de identidade traz como filiação o nome da chef Maria Vitória (ex-Bistrô Montagu e atual responsável pelos restaurantes dos hotéis Marina). Mas como a gastronomia não se rege pela lógica do Senado Federal, DNA herdado não é carta de recomendação. O jovem Paulo foi então à luta e aprendeu as artes e os oficios com professores de peso: Alex Atala, Claude Troisgros, o português Vitor Sobral e mais um estágio no estrelado Mugaritz, no País Basco, com o chef Andoni Aduriz. Para quem tem apenas 32 anos, já é um carreira e tanto!
Comandando nosso jantar, Paulo deu uma demonstração de sua maturidade profissional. Foram 8 etapas - em porções de degustação - que me ganharam já pelo visual, pois o pratos eram belíssimos e isso, para mim, já é metade do prazer de comer. Lançando mão da estética gastronômica espanhola, o chef, no entanto, evita cair na tentação das espumas, das fumaças e das esferificações tão em moda em nossas mesas, e serve comida com gosto e com cara de comida. Uma maravilha!
Palmas para as Vieiras grelhadas, com chips de batata-doce e um estupendo vinagrete de maracujá, que trazia a crocância das sementes para se contrapor à maciez dos moluscos. Um viva para o Robalo crocante, acompanhado com purê de batatas e com palmito pupunha. Bravo também para o tenro Leitão assado com uma crosta crocantinha, secundado por uma farofa de broa e chorizo, um abacaxi grelhado e uma irretocável gelatina com o caldo do próprio suíno, tudo constituindo um conjunto insólito mas de grande impacto no paladar.
A carta de vinhos - que segundo o gerente Valmor Dutra passará por uma breve reformulação - traz 130 rótulos. Os preços variam de R$75 - por um Espumante Chandon Brut - a siderais R$2.460, por um respeitável Vega Sicilia Unico 2000. Mas a tendência é mesmo para vinhos mais caros e não há muitas opções abaixo de 100 reais: são apenas 18 rótulos.
Vale contar, entretanto, que o sommelier Luciano Mayworm escolheu dois vinhos excepcionais para escortar as obras de Paulo Góes e que custavam só um pouco acima de 100: ambos tinham etiqueta de exatamente R$120 e eram surpreendentes e deliciosos.
O desconhecido Tenuta Dettori Renosu Bianco (importado pela Decanter), vinho não safrado, pois mistura diversas colheitas, proveniente da inesperada IGT Romangia, da Sardenha, logo tornou-se minha nova paixão. Elaborado com as castas Vermentino e Moscato de Sennori, de vinhas de mais de 40 anos, é orgânico, utiliza leveduras indígenas, não sofre clarificação nem filtração e é fermentado e afinado em cubas de cimento por 3 anos. Um vinho com receita de séculos atrás e mais natural, impossível. Com uma cor dourada, de aspecto ligeiramente turvo, seu nariz é intenso e sedutor, com aromas de pêssego, mel e tangerina. Na boca, nota-se um açúcar residual, mas com acidez poderosa para equilibrar o conjunto de impressionante corpanzil. Não é vinho para qualquer paladar, mas é uma experiência fascinante. Gostei tanto que, no dia seguinte, eu - proibido por mim mesmo de comprar mais vinhos - não resisti e encomendei 3 garrafas. Nem sei onde poderei guardá-las.
O vinho tinto que nos foi servido também me era desconhecido: o chileno Pargua 2007 (importado pela Vinos & Vinos), corte que mais parece uma enciclopédia de castas, misturando 38% Carménère, 30% Cab Sauv, 20% Cab Franc, 6% Merlot e 6% Syrah. É elaborado pelo enólogo francês Jean Pascal Lacaze, que trocou de continente para fazer vinhos no Chile e é também aclamado por seu outro filho, o Domus Aurea. Aromas de terra molhada, café, especiarias, rosas e muita fruta vermelha, é intenso, macio, equilibrado e elegante, e louco para harmonizar com o leitãozinho do chef Paulo.
Oscar Daudt
1307/2013 |