
Eu confesso que me inspirei na infeliz afirmação de nossa presidente - "Lula não vai voltar porque nunca saiu" - para escolher o título desta matéria. Mas o caso de Ludmilla Soeiro é um bem diferente e nada vergonhoso: a chef nunca deixou oficialmente suas responsabilidades de comandar as panelas do Zuka e apenas se afastou temporariamente em licença-maternidade.
Quando estive no restaurante ano passado, Ludmilla estava em seus últimos meses de gravidez e mal conseguia parar em pé. Logo a seguir, ela saiu de licença, deu à luz o pequeno Théo e só voltou agora em abril. Mas voltou com a corda toda e logo reformulou o cardápio do restaurante, incluindo 16 novas criações. E esta semana, estive no Zuka para conhecer as sempre benvindas novidades.
Se eu tivesse que definir, em uma única palavra, a cozinha de Ludmilla, não teria grandes dificuldades: de bate-pronto responderia SA-BO-RO-SA. Depois é que eu iria me lembrar de que os pratos são bem apresentados, que os ingredientes são fresquinhos e que a criatividade come solta por lá.
Sabe aqueles jantares em que tudo dá certo? Pois a chef nos apresentou uma longa sequência de 8 etapas, prudentemente apresentadas em porções de degustação, e todas elas se nivelaram por cima. Foi um espetáculo!
O Tartar de atum com abacate e maionese de wasabi (R$25) vinha encimado por crisps de pão - que ideia maravilhosa! Os Crisps de nhoques ao grana padano trufado (R$26) evocaram minha infância, quando dias de nhoques fritos eram dias de festa, e entregar-se, vez por outra, a esse prazer "não tem preço"!
Uma simples salada veio com roupagem de festa: era a Salada de rosbife e mini-verdes com torradas de cebola e parmesão (R$38). Está bem, eu concordo, o preço não era de salada, mas também nunca pensei que uma salada pudesse ser tão gostosa!
A seguir, saltando para o topo da pirâmide, as Vieiras com tortelli de foie gras (R$89) eram excepcionais e o caldinho tentador não permitia que se largasse o prato antes de secá-lo por completo.
O Peixe do dia em crosta de pão com mouselline de baroa (R$74) era um cherne tão branquinho, tão macio e tão delicado que mais parecia um presente de mãe para seu filhinho. E fez contraponto ao poderoso Tagine de mignon em massala e abacaxi, acompanhado por arroz basmati (R$68), que vem à mesa com pompa e circunstância, como se estivesse chegando das Arábias, com uma cúpula de barro concentrando seus exóticos aromas. Era inebriante...
Para o "gran finale", Ludmilla reservou uma supreendente - e obviamente cara (R$98) - Costeleta de cordeiro com cuscus de milho e emulsão de foie gras, um sincretismo gastronômico elaborado com precisão cirúrgica pela chef, que delicia e conquista, fazendo até esquecer o rombo que deixa no bolso.
Um jantar assim tão requintado foi harmonizado com segurança e ousadia pelo jovem sommelier Rafael Motta, há apenas 3 meses tomando conta da adega da casa, e fez um bonito.
Acompanhando a primeira etapa, um mineralíssimo Kuenz-Bas Riesling Tradition 2010 (R$128) só faltava trazer o selo da Petrobrás, com seus encantadores aromas de petróleo. Um vinhaço.
O brasileiro Mario Cohen já é famoso por seus azeites Punta Lobos, produzidos no Uruguai. E agora, com a consultoria de Paulo Nicolay, entra na produção de vinhos nos trazendo um Punta Lobos Tannat Merlot 2011 (R$85) que descreve, de forma insólita em seu rótulo, suas intenções: Honesto. Essa foi a escolha de Rafael para continuar servindo nossas taças. E confidenciou-me que é um dos vinhos mais vendidos na casa. Como o Zuka fica a poucas quadras da residência de nosso governador, mais do que um vinho, é um manifesto!
Quando se pensa no Priorato, logo vem à mente cifras astronômicas. Mas o Cims de Porrera Solanes 2006, por R$147, pode até ser considerado uma barganha. Um grande vinho por um preço - de novo - honesto.
Oscar Daudt
02/08/2013 |