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França

Organização germânica
Não há no mundo vinho mais cobiçado do que os espumantes da denominação Champagne. E estamos falando de big business: o mercado estima que a produção anual da região é de estratosféricos 320 milhões de garrafas! Apenas o grupo LVMH (com suas marcas Moët & Chandon, Veuve Clicquot, Ruinart e outras mais) é responsável pela elaboração de mais de 60 milhões de garrafas. E ainda assim, os Champagnes são bastante valorizados e sua etiqueta carrega um sobrepreço que todas as demais regiões do mundo gostariam de poder cobrar. Não existe Champagne barato, muito embora a participação do espumantes de entrada, não safrados, representem cerca de 80% a 90% da produção total.

E como é que a região consegue subverter as leis de mercado e associar alta produção com um preço de joia rara? Uma parcela do mérito deve ser creditada ao CIVC - Comité Interprofessionnel du Vin de Champagne, o órgão que regula com mão de ferro todos os aspectos técnicos, comerciais, de comunicação e de defesa da marca. Tudo em Champagne é estritamente controlado. A organização do CIVC leva em conta as três entidades que estão envolvidas na produção: as grandes casas, as cooperativas e os produtores de uva. E tive a oportunidade de ouvir a declaração mais surpreendente em relação a essa estrutura. Disse-me um produtor que ela é devida - sabem a quem? - aos alemães, durante o tempo em que a França foi ocupada na Segunda Guerra Mundial!

O sucesso também se deve, é claro, à excepcional e regular qualidade de seus vinhos, reconhecida pelos apreciadores, bem como às primorosas e irresistíveis embalagens que apresentam os produtos. E, em grande parte, aos maciços investimentos em campanhas de marketing que os grandes nomes da região dispendem, conquistando os corações e as mentes dos apreciadores. Resistir, quem há-de?

Uma viagem didática
Aproveitando uma viagem de lazer a Paris, nossa confraria - o Bonde do Vinho - decidiu visitar a região de Champagne. Recebemos todo o apoio do representante do CIVC no Brasil, Sebastian Sachetti, que organizou um programa especialíssimo para nosso grupo. Inicialmente, tivemos uma apresentação na Maison de Champagne, onde pudemos conhecer a estrutura e as funções do Comité, seguida de uma degustação, como não poderia deixar de ser.

Nos demais dias, partimos para visitas às vinícolas, escolhidas caprichadamente para nos mostrar o funcionamento das diversas entidades: algumas grandes Maisons, uma mega-cooperativa e um pequeno produtor independente. Foi excepcional!

O melhor dos melhores
Das grandes e emblemáticas casas de Champagne, estivemos na Ruinart, na Pommery, na Deutz e na Demoiselle. É nelas que reside o grande charme da região, que se exibe em toda a sua sofisticação. Foram visitas dinâmicas, muito bem estruturadas, divertidas, curiosas, por caves centenárias, finalizadas com degustações de excelentes rótulos.

Muito interessante e bastante didática, foi a tarde que passamos na Nicolas Feuillatte que, como eles mesmos se definem, é uma cooperativa de cooperativas. Acompanhados pelo diretor de enologia, Guillaume Roffiaen, tivemos a oportunidade de conhecer uma linha de produção com tecnologia de ponta, toda robotizada, que por vezes nos dava a impressão de estarmos dentro de uma fábrica de refrigerantes. Os números são impressionantes! Criada apenas em 1985, a cooperativa tem 4.100 associados, com 2.200 hectares de vinhedos, e elabora 10 milhões de garrafas ao ano. E, pasmem!, já está posicionada como a maior fornecedora de Champagnes na própria França, batendo seus concorrentes com muito mais história e prestígio. Surpreendente!

Produtor independente
Mas na opinião unânime do grupo, a melhor visita foi a realizada à Champagne Aspasie, pequeno viticultor localizado em Brouillet, com uma produção de apenas 100.000 garrafas ao ano. Recebidos pelo proprietário, entusiasmado produtor que defende os vinhos sem maquiagem, que respeitem a natureza. Utilizando métodos orgânicos - sem ser xiita - seu objetivo é o de exibir o que as terras do Marne podem oferecer de melhor. E conseguiu: desde seu espumante de entrada até o topo da linha, seus espumantes são puros e agudos, com muita fruta e elegância, com estrutura invejável e muita cremosidade.

Dois destaques não podem passar desapercebidos: o Champagne Brut de Fût é suportado por uma passagem em barricas de carvalho - novas e velhas - por 5 meses, e esse processo, que poderia parecer assustador, reflete-se em uma elegância sem par, com a madeira adicionando uma complexidade sem empanar a fruta e o frescor. Bravíssimo! E, ainda mais surpreendente, seu Champagne Cepages d'Antan é um Blanc de Blancs sem Chardonnay! O produtor Paul-Vincent Ariston é um dos poucos a cultivar as raríssimas castas Arbanne, Pinot Blanc e Petit Meslier, autorizadas na região, mas que representam, atualmente, apenas 0,3% dos vinhedos de Champagne. Um momento curioso e especial!

Oscar Daudt
28/05/2014
Apresentação na Maison de Champagne
A sede da Maison Louis Roederer Brut Premier Charpentier Terre d'Emotions Blanc de Noirs
Paul Goerg Brut 2005 Larmandier-Bernier Rosé de Saignée Gosset Brut Excellence
Visita à Nicolas Feuillatte
A linha de produção é toda robotizada Os diversos tamanhos das Champagnes Nicolas Feuillatte Cuvée 225 Brut 2005
Nicolas Feuillatte Cuvée 225 Brut Rosé 2005 Nicolas Feuillatte Palmes d'Or Brut 2002 Nicolas Feuillatte Palmes d'Or Brut 2005
Visita à Ruinart
A Ruinart foi a primeira maison estabelecida em Champagne, em 1729 O acesso às caves subterrâneas As caves se extendem por 8 quilômetros, a 40 metros de profundidade
Escada das antigas minas de gesso A maquete das antigas minas galo-romanas A excelente degustação oferecida
Visita à Pommery
O colorido prédio da Pommery O belo tonel de 75.000 litros foi construído para a exposição de Saint-Louis (EUA) As belas caves
A figura de Louise Pommery talhada nas caves de gesso A coleção de garrafas antigas tem um Champagne de 1874 A degustação oferecida
Visita à Deutz
O anjinho símbolo da Deutz A mansão da família Deutz Vizinhos à vinícola, os vinhedos exibem os respiradouros das caves
Nas caves, pode-se ver o solo de gesso A coleção de Jeroboans A espetacular degustação
Visita à Demoiselle
A bela mansão da Demoiselle A sede foi restaurada por Mme. Vranken, a proprietária do Grupo Pommery Da mansão, tem-se uma bela visão da Pommery
As caves são apenas cenográficas Demoiselle E.O. Diamant Brut
Visita à Aspasie
A sede da vinícola O entusiasmado produtor Paul-Vincent Ariston O orgulho de ser independente
A coleção de fósseis de Champagne Aspasie Cépages d'Antan Brut Aspasie Brut de Fût
O Bonde do Vinho
Luiz Carlos, Ana Maria, Maria Ilda, Anselmo, Luciana e Oscar

Comentários
Antonio Carlos do Amaral Przewodowski
Advogado
Rio de Janeiro
RJ
28/05/2014 Prezado Oscar, ótima matéria, sempre enriquecendo!

Contraponto, Champagne é barato.

Sempre adorei champagne e tinha escrúpulos em consumi-lo por considerar caro. Contudo, um tempinho atrás li um artigo (tentei localizar mas não consegui), não tenho certeza se traduzido do texto de um critico inglês, ou se era de algum critico brasileiro que fazia referência a um artigo inglês, que, resumidamente, me convenceu que champagne é barato.

No que se refere aos tintos, os apreciadores tem uma grande dispersão quanto a preferência, muitos preferem os bordeaux (quem vai dizer que um bom bordeaux é barato?), outros Borgonha (um bom é ainda mais caro que bordeaux), mas tantos outros apreciam Brunellos (também caros), ou barolos, barbarescos, amarones, não esqueçamos dos portugueses, espanhois, só para ficar entre as regiões mais tradicionais. São muitas as opções de vinhos tintos de grande reconhecimento, e quase sempre a preços mais elevados do que o de um champagne, mesmo os champagnes mais caros raramente se aproximam dos tintos valorizados.

Se consultarmos entre os apreciadores qual seu espumante favorito qual seria o percentual que diria algo diferente de champagne? Acredito que uma minoria. E a intensificação do emprego de recursos para a produção de champagne? É necessário se partir de vinhos já eleborados (ou seja que incorporam todos os custos de se produzir o vinho) para e espumatização do champagne, num processo artesanal(mão de obra) e demorado (custo financeiro). É muito dispendioso o processo de produção de champagne. E a conclusão é deliciosa: champagne é barato.

Brasileiro nao precisa de champagne: http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2014/05/1447940-brasileiro-nao-precisa-beber-champanhe-diz-especialista-britanico.shtml
Rafael Mauaccad
Enófilo
São Paulo
SP
28/05/2014 Oscar,

Esta é a viagem dos sonhos para qualquer enófilo, e você nos brinda com sua matéria.

No texto está citado, "A organização do CIVC leva em conta as três entidades que estão envolvidas na produção: as grandes casas, as cooperativas e os produtores de uva.", e vale a pena relembrar como estas são distinguidas. O quem é quem em Champagne:

-NM (Negociant-Manipulant) indica uma Maison que possui vinhas próprias, mas também compra uvas de outros produtores e comercializa o com seu nome.

-RM (récoltant-manipulant) indica um produtor proprietário de vinhas e que produz com suas uvas.

-RC (Récoltant Coopérateur) indica um produtor que produz e vende com a ajuda e suporte de cooperativas.

-CM (Coopérative de Manipulacion) indica uma cooperativa de produtores que usa uvas próprias, ou parte delas, para a produção e comercialização.

-SR (Soociété de Récoltants) é a mesma da CM acima, mas os sócios pertencem a uma mesma família.

-ND (Négociant Distributeur) indica uma empresa que adquire garrafas de terceiros para depois etiquetá-las e comercializá-las.

-MA (Marque Auxiliaire) indica empresa ou sociedade fora da região.

Santé
Anselmo Federico
Engenheiro e enófilo-ABS
Rio de Janeiro
RJ
29/05/2014 Grande Oscar,

Você bem sabe da minha predileção por vinhos, principalmente tintos, Amarones (apaixonantes), Bordeaux, Barolos, Bourgogne rouges e recentemente blancs, Brunellos.

Mas a partir dessa viagem, os Champagnes terão um lugar de destaque nas minhas predileções enológicas, notadamente os Champagnes que tiverem no rótulo ou contra-rótulo o código RM (Récoltant-Manipulant), pois se os demais produtores tiverem 1% da empolgação, dedicação e amor à produção como Paul Ariston, com certeza esses Champagnes serão de excelente qualidade.

Dos mais de 70 Champagnes apreciados, os 7 apresentados e elaborados por ARISTON PÈRE & FILS entram com folga na lista dos 20 mais sensacionais.

Abraços
EnoEventos - Oscar Daudt - (21)99636-8643 - [email protected]