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Hungria

A busca da tradição
Há alguns anos, chama a atenção o fato de a Hungria estar fazendo parte da corrente que visa o resgate de uvas minoritárias com a recuperação da Kadarka, uma de suas variedades ancestrais que é um tesouro até há pouco tempo menosprezado em seu patrimônio vitivinícola.

Sua origem ainda é discutida, mas é certo que sua introdução neste país é atribuída a povos balcânicos que, no século XVII, povoaram uma parte da Hungria e a trouxeram consigo para poder continuar bebendo o vinho a que estavam acostumados. De acordo com versões de historiadores, seu nome se relaciona com a região do Lago Skadar, localizado na atual fronteira entre a Albânia e Montenegro.

Nos séculos seguintes, a Kadarka foi extensivamente plantada na Hungria, mas depois do surto da filoxera, seu cultivo ficou concentrado principalmente na Grande Planície, que possui solo arenoso, à qual a casta se adaptou perfeitamente devido a suas raízes profundas e à sua tolerância a longos períodos de seca. Durante a época comunista, esta casta ganhou a preferência do regime por seu alto rendimento e, há 50 anos, ocupava um quarto de toda a superfície plantada no país. Com as mudanças dos anos 1990, seu cultivo decresceu paulatinamente até quase desaparecer, visto que as novas vinícolas, em mãos privadas, preferiam variedades mais em voga. Atualmente, a Kadarka é plantada em pouco mais de 1.000 hectares, o que representa apenas cerca de 1% de todos os vinhedos.

Seu renascimento se iniciou na década passada com a seleção de seus melhores clones nos centros de investigação vitivinícola nacionais e, com o uso de três escolhidos, resultados promissores têm sido obtidos nas regiões de Csongrád, Hajós-Baja, Kunság, Szekszárd, Villány y Eger. Na imprensa especializada, alguns críticos a identificam como a "Pinot Noir de Panonia", não apenas porque o vinho resultante tem características organolépticas semelhantes à clássica variedade borgonhesa, mas também porque a uva é igualmente caprichosa. A esse respeito, um crítico de vinhos assim a descreveu: "É uma variedade mimada, afetada e histérica, que quer sempre estar no centro das atenções."

A maioria dos produtores de Kadarka está otimista com seu futuro, apesar de seu cultivo não ser isento de riscos. Seus argumentos se baseiam no dever de manter as tradições. No entanto, continuam surgindo dúvidas sobre seu verdadeiro caráter e se discute se ela serve verdadeiramente para se obter grandes vinhos varietais ou se é preferível utilizá-la cortada com variedades típicas locais.

O vinho elaborado com a Kadarka tem, na maioria dos casos, cor rubi vivo, é leve e apresenta basicamente aromas e sabores condimentados (páprica e pimenta preta), com notas de frutas vermelhas frescas (cereja, framboesa, morango e groselha). Recentemente, produtores começaram a lançar exemplares mais poderosos e complexos, estagiados em barricas de carvalho, o que os favorece bastante (um exemplo é o Sauska Kadarka 2011, de Villány).

A personalidade multifacetada dos vinhos revelou-se na nova edição do Concurso Internacional Kadarka, realizado em meados de março passado, na cidade de Kiskörös, onde competiram 141 vinhos (118 varietais e 23 de corte). O grande prêmio foi dedicado a um vinho de corte (Kadarka, Kékfrankos, Merlot e Cabernet Sauvignon) da safra 2009, da vinícola Besenyei Borház, da região de Eger. Esta mesma vinícola também arrebatou o prêmio de "Melhor Varietal".

Os vinhos de Kadarka se inserem na arte culinária húngara como o acompanhante perfeito de pratos tradicionais como, por exemplo, a Sopa de peixe à húngara (halászlé), que tem apenas três ingredientes básicos: peixe de água doce, cebola e páprica. Originalmente, por ser um prato consumido pelos pobres, preparava-se ao ar livre, em um caldeirão, para o consumo de toda a família. Atualmente, vários restaurantes ribeirinhos se especializaram nessa rica iguaria que impressiona também os turistas estrangeiros. Uma sugestão em Budapest seria o restaurante Horgásztanya Vendéglo.

József Kosárka é diplomata, gourmet e escritor húngaro; membro da Academia Húngara do Vinho, é colunista de publicações de enologia em seu país; foi embaixador da Hungria no Peru e no Chile; associado à FIJEV

Tradução: Oscar Daudt

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