
Privar de um jantar com a grande dama do vinho argentino, Susana Balbo, foi uma experiência gratificante e enriquecedora. Mas o momento mais inesquecível foi quando, já embalados pela alegria do vinho, ela e eu ensaiamos um dueto, cantando o antigo bolero Nosotros, harmonizado com seu vinho de mesmo nome. Não tem preço!
Este ano, Susana assumiu mais uma vez a presidência da Wines of Argentina, a poderosa associação promotora da exportação dos vinhos de nosso vizinho. Ao mesmo tempo em que me confessou que há um rodízio dos mesmos nomes no comando da WofA, contou que irá propor o fim da reeleição para que haja uma benvinda renovação. E determinou que cada diretor seja acompanhado por um jovem assessor, de onde pretende que surjam os futuros líderes do setor.
Em casa, a renovação também impera e com indisfarçado orgulho relata que seus dois filhos desempenham papéis de comando na Dominio del Plata, sua respeitada vinícola: Jose, como Gerente Comercial e enólogo, e Ana, como Gerente de Marketing. Susana já fala até em deixar a administração para a nova geração.
Mas pensam que ela irá se aposentar? Nada disso! A enóloga confidenciou que estuda aceitar o convite para se candidatar a senadora da República Argentina!
Sem falta modéstia, Susana sabe que seu nome é bastante conhecido e respeitado pelos consumidores, ao mesmo em que Domínio del Plata, o nome de sua vinícola, é de penetração limitada.
Isso a levou a reorganizar sua linha de vinhos para tirar proveito da força de sua identidade. A linha Crios, de grande aceitação por sua relação qualidade e preço, passará a ser conhecida como Crios de Susana Balbo; a linha BenMarco sai de cena e será rebatizada simplesmente como Susana Balbo.
O primeiro vinho da noite nasceu de um desafio de Patricio Tapia, o renomado autor do guia Descorchados. Admirador do Crios Torrontés, Patricio pediu que a enóloga elaborasse um Torrontés mais sério, barricado, que projetasse a casta a nível internacional.
E assim nasceu o BenMarco Torrontes 2013 - de vida curta, logo será chamado de Susana Balbo Torrontes 2014 - com uvas provenientes de Altamira e que repousa por 4 meses em barricas novas que, no entanto, não se exibem nos aromas, mas sim na complexidade. Esqueçam também aqueles exageros aromáticos que a Torrontés normalmente empresta aos vinhos. O nariz é elegante e cítrico e a boca cremosa, fresca, imponente e longa. Eu nem deveria falar do preço para não estragar o momento, mas fazer o quê? Devo dizer que custa R$170.
Acompanhando o prato principal, dois importantes vinhos assinados por Susana. O Susana Balbo Brioso 2010 é, como disse a enóloga, uma aula-síntese sobre Bordeaux, pois é cortado com as 5 principais uvas daquela região: as Cabernets Sauvignon e Franc - que dominam o corte, com cerca de 70% - temperadas com Malbec, Petit Verdot e Merlot. Repousa por 15 meses em barricas novas de carvalho francês e serve a elegância em seu mais alto grau.
Lembro-me como se fosse hoje de um almoço no Mr. Lam, em 2007, em que Susana apresentou seu vinho Nosotros 2005, anunciando que ele tinha 200% de barricas novas! Como assim? Pois o vinho estagiava 9 meses em barricas novas e depois era trasfegado para outras barricas novas onde ficava mais 9 meses. Os tempos eram outros e eu mesmo gostava desses exageros amadeirados.
Os tempos mudaram, os consumidores mudaram e Susana, atenta, está aplicando uma mudança de estilo. Seu vinho mais importante agora tem menos madeira, mais elegância, mas mantendo uma alta concentração de frutas. E o preço? Nem é bom falar: entre 300 e 350 reais...
Oscar Daudt
19/08/2014 |