|

Em um primeiro olhar, a gastronomia japonesa, do chef Nao Hara (do Nao) e a contemporânea, do chef belga Frédéric de Maeyer (do Eça), não tem nada a ver uma com a outra. Ledo engano. Quando os dois craques se juntaram para fazer mais uma edição do jantar a quatro mãos, o que deu foi samba.
Funciona assim: Fred vai até o restaurante do Nao. Ambos dividem a criação do couvert e da sobremesa. E cada um monta uma entrada e um prato. Nós, fazemos apenas a reserva, pagamos R$130,00, e daí por diante, nos preocupamos apenas em nos deliciarmos com o que está por vir.
Fui com minha filha Nicolle, que tinha acabado as provas de final de ano e estava merecendo uma folguinha.
O couvert, criado pelos dois, era mousse de bufaline, molho virgem com aji (pimenta) e erva huacaty (dedo do Fred), e um rolinho vietnamita recheado com maminha desfiada, brotos e ervas e croquete de feijão com cogumelos (criação do Não). Nicolle, que não é fã nem de cogumelos, nem de pimenta, comeu tudo sem reclamar. Fred disse que está começando a trabalhar com aji agora, mas acho que ele já acertou na mão. Eu poderia comer uns 30 rolinhos daqueles. O croquete era gostoso também.
A primeira entrada foi feita pelo Nao: lagostim grelhado, trouxinha de vieras ao forno com pupunha confitada com açafrão e bisque de coral. Que delícia! O lagostim no ponto exato, junto com o palmito, era uma loucura. Uma bisque suave, na medida certa. Nicolle amou.
A segunda entrada, feita pelo Fred, não deixou nada a desejar: foie gras mi-cuit (meio cozido) em seu caldo com lichia, jambo e sal negro. Nicolle faminta como é, comeu tudo muito rápido. Preocupada com o tamanho das porções, achou que era pouco e me perguntou se tinha alguma coisa para comer em casa. Eu, que comi devagar para saborear todas as nuances do prato, quase morri de rir com o comentário.
Vieram então os pratos principais. O primeiro foi o do Não: bacalhau grelhado com gateau de baroa e emulsão de azeitonas e alcaparras. Um chef oriental fazendo bacalhau! Eita mundo globalizado. Mas foi até bom, porque ele sabia muito bem o que estava fazendo. Em cima do peixe veio um tomatinho cereja que realmente funcionava como se fosse a cereja do bolo! Lembrou-me a época em que se colocava cereja em calda em tudo. Mesmo pequeno, o tomate fez toda diferença.
O prato do Fred foi lombo de cordeiro em crosta de foccacia com queijo de cabra e alho confit, caviar de berinjela, chutney de tomate com pimenta biquinho. O lombo estava tenro e macio, junto com a berinjela e o chutney ficou ainda melhor.
Hora da sobremesa. Nicolle achou que teríamos que escolher uma das opções. E ficou surpresa quando chegou um prato com todas elas juntas. As criadas pelo Fred foram doucer de pistache com framboesa; arroz negro e fondant de chocolate ao leite e steusel com especiarias. É nessa hora que a gente lembra que tem um chef belga na cozinha. As do Nao foram cheese cake de lichia; rabanada com cereja e calda vermelha, creme de banana com chocolate branco e farofa de castanhas brasileiras. Todas estavam muito boas, mas cada pessoa tem uma preferência. Nicolle se apaixonou pelo fondant. Eu adorei a rabanada.
Já no carro, perguntei se ela ainda estava com fome depois de tanta comida. Ela disse que a fome já tinha ido embora fazia tempo. Perguntei o que ela tinha gostado mais. Ela respondeu que era impossível decidir. Mas concordamos que as entradas foram o ponto alto do jantar.
Mas a moral da história é que, quando dois chefes que sabem o que estão fazendo resolvem se juntar, até quem não é fã de cogumelo passa a gostar e pimenta vira mesmo refresco.
|
|
|