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 (texto publicado em minha coluna na revista GOSTO em sua edição de aniversário)
Comemoro o 1º aniversário (de muitos) da revista Gosto homenageando um outro aniversariante, Chopin. Para este duplo-brinde o vinho não poderia ser outro, Champagne!
O mundo celebra este ano o bi-centenário de nascimento do maior poeta do piano, arquétipo do artista romântico e meu compositor predileto. Champagne e Chopin partilham de vários traços semelhantes. São ao mesmo tempo populares e clássicos, simples e sofisticados. Ambos são essencialmente delicados, diretos, emocionais, sinceros e transcendem tecnicalidades.
Em 1830, aos 20 anos de idade, Chopin mudou-se de Varsóvia para Paris. A cidade-luz, que fervilhava culturalmente e transbordava de Champagne, adotou o jovem compositor que, em pouco tempo, conquistou os salões da alta sociedade.
A elegância pessoal de Chopin era notória. Alto e magro como uma flûte, com seu suave gestual ao tocar, seu vestir impecável, sua educação refinada e sua ligação com a nobreza, ele criou uma imagem de dândi, que harmonizava com sua música. A indústria do Champagne sempre cultivou esta mesma atitude, consonante com o conteúdo das garrafas.
Assim como o Champagne só foi viável graças às garrafas mais grossas e vedação com rolhas amarradas, as composições de Chopin só foram possíveis com inovações em seu instrumento. Em 1821, Sébastien Érard patenteou um novo piano, com pedais e escapamento duplo (que permitia ágeis notas repetidas), recursos muito usados nas criações chopinianas.
A maior contribuição de Chopin à história foi ter produzido música para os recursos do piano, ao invés de tentar tirar dele uma sonoridade orquestral. O mesmo se dá com o Champagne, que só alcançou sua grandeza quando os vinhateiros da região desistiram de produzir vinho tinto e dedicaram-se a fazer um blanc de noirs com borbulhas.
Chopin era perito em improvisar. Sentava-se ao piano e deixava a centelha divina da criação fluir por seus dedos. No Champagne este raio de luz divino se expressa nos grandes millésimes, os Champagnes com safra, pura obra da natureza.
Por fim, Champagne e Chopin são os enfants gâtés do vinho e da música. Chopin tem lugar à parte no coração dos pianistas, enquanto o Champagne goza de um carinho especial por parte dos discípulos de Baco. São raros os vinhos/compositores tão populares, durante tanto tempo, para um público tão diverso.
Para cada Champagne um Chopin Chopin compôs em diferentes formatos, como noturnos, prelúdios, polonesas, valsas, improvisos e scherzos. O Champagne também se apresenta sob diversas formas e para cada uma sugerimos uma obra Chopin:
Champagne NV ou sans année: o Champagne sem safra, de festa, alegre e fresco. Para este que tal um Chopin em tom maior, de melodia ascendente, como a Grande Valsa Brilhante op. 18.
Blanc de Noirs: feito unicamente com uvas tintas, Pinot Noir e/ou Pinot Meunier, normalmente estruturado e sério. Sugiro um Chopin firme, substancioso e patriótico, como a Polonaise Heróica, op. 53.
Blanc de Blancs: feito unicamente com a uva branca Chardonnay, normalmente mais delicado, elegante e aristocrático. Este será um bom momento para a perfumada e sofisticada Fantasia-Improviso op. 66.
Rosé: o Champagne cor de rosa, com o charme de sua cor, maior cremosidade e versatilidade à mesa. Porque não um Chopin irresistivelmente popular e untuoso, como o Noturno op. 9 nº 2.
Dosage Zero ou Nature: sem açúcar, totalmente seco. Pureza, força, complexidade, expressão mais clara de seu terroir (sem a "maquiagem" do açúcar), são qualidades inerentes a um bom Nature. Experimente com a Balada nº 1, dramática, poderosa, complexa, uma sequência de estados psicológicos.
Millésime: o Champagne em seu ápice, só elaborado em grandes anos, de grande estrutura e longevidade, que pede uma obra de envergadura, como a Fantasia op. 49, obra monumental, para muitos a obra prima do compositor. |
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