"LF""LF""LF""LF""LF"
Matérias relacionadas
Colunistas
 
Gênio que é gênio é gênio em tudo.

Leonardo da Vinci nasceu em abril de 1452, numa fazenda perto da cidadezinha de Vinci, na Toscana. Filho bastardo do advogado Piero (da Vinci, já que nessa época era comum as pessoas serem chamadas pelo prenome e pelo nome da cidade onde nasceram) e de uma camponesa, Caterina. O menino foi criado pelos avós paternos, nessa pequena propriedade que cultivava trigo e azeitonas.

A alimentação se completava com fava, feijões, grão-de-bico, ervilhas, além de pão, alho, cebola, nabos e queijo de ovelha. E, tratando-se da Itália, obviamente bebia-se vinho desde criança. Leonardo se iniciou com cinco anos, mas o vinho da época era temperado com especiarias, ervas, mel misturado com água e, às vezes, até mesmo com água do mar.

Ao completar 8 anos, porém, a família se transferiu para Florença, porque seu pai foi nomeado tabelião. Leonardo então deixa o campo para viver numa das cidades mais ricas da Itália. Em Florença, circulavam os prósperos mercadores do século 15 e os melhores produtos do campo convergiam para lá e se tornavam as matérias-primas do consumo culinário da elite renascentista. Ora, o inquieto Leonardo não poderia ficar de fora. Começou trabalhando na taberna Três Caracóis, até que abriu um restaurante com o sócio e amigo Sandro Botticelli, mais tarde outro célebre pintor florentino, cuja obra-prima é o O Nascimento de Vênus.

Mas nenhum dos dois entendia patavina de cozinha. Além disso, os hábitos não-carnívoros de Leonardo - foi vegetariano 500 anos antes dos nossos naturebas - era ótimo para a sua saúde, mas levaram o estabelecimento à ruína.

Muda-se, então, para Milão (não só por isso), em 1482, e vai servir a Ludovico Sforza, o poderoso duque da Lombardia. Para ele, trabalhou como músico, inventor de armas, pintor, mas os seus conhecimentos culinários e a sua já agora reconhecida capacidade de criar mecanismos para o entretenimento da corte conferiram-lhe um status especial: mestre de banquetes. Leonardo não apenas inventava utensílios - ele criou o guardanapo, a tampa das panelas (antes usava-se panos molhados para vedá-las) - como coordenava jantares-espetáculos, em que a arte de preparar e apresentar os pratos faziam a diferença das demais mesas-de-castelo e pontuavam a escala de prestígio do anfitrião.

Mas já naquela época - de novo, há cinco séculos - Leonardo defendia a simplicidade dos alimentos e a beleza de uma mesa bem posta. Registrou no seu diário: "É meu dever tornar cada cerimônia gastronômica um feito inesquecível. Libélulas, plantas aromáticas, fontes de água, grilos, água de rosas para enxugar as mãos, pequenas estátuas de marzipã, geléias coloridas e, lá fora, cisnes, sinos, corneteiros e avestruzes dando voltas e mais voltas para dar vida ao cenário externo". E note-se que nesses primeiros tempos romanos, o vinho vivia em barris e só era acondicionado em jarros ou odres quando era levado à mesa. Só no inicio do século 17 é que surgiram novas técnicas de sopro (em Murano, na Itália) que facilitaram a produção de vidro para confecção de garrafas. A isso se somou, coincidentemente na mesma época, o providencial surgimento da rolha de cortiça e do saca-rolha.

Na sequência, e como era de sua índole, Leonardo foi fundo em suas pesquisas. Desenvolveu a teoria de que a digestão é um processo de cozimento provocado pelo calor do corpo. Donde pimentas e outras especiarias "quentes" constarem dos cardápios, para acelerar o ciclo alimentar. E mais: Leonardo via na comida um papel fundamental, não apenas pelo seu sabor, mas como fonte de saúde. E anotava tudo o que pensava sobre gastronomia em manuscritos que levavam o nome de "codex". O que trata dos assuntos da mesa é o Codex Romanoff, cuja cópia foi achada em 1981.

Assim era Leonardo da Vinci. Como observa Marcos Troyjo, conheceu e dissecou o ser humano, aves e peixes e, por isso queria que esse ser humano encontrasse a dimensão dos deuses. Não podia voar? Pois inventou a asa delta e o helicóptero. Não podia viver embaixo d'água? Pois inventou o submarino. Frequentou o fausto dos Borgias, a empáfia do dodges de Veneza, a soberba dos senhores de Roma e a sabedoria do Rei de França, François I, em cujos braços morreu em 1519, aos 67 anos, na pequena cidade de Cloux, perto de Amboise, na Touraine.

Ah!, sim, e nos intervalos, pintou a Mona Lisa...
 
Comentários
Vania Moreira
Aluna do curso básico da ABS
Rio de Janeiro
RJ
18/08/2009 Caro Reinaldo,

Lá vem você de novo com mais um matéria deliciosa! Onde você encontra essas pérolas?

Curioso, eu não sabia que da Vinci era vegetariano, muito menos banqueteiro e dono de restaurante! E ainda por cima que teve Botticelli como sócio nessa empreitada. Se ele foi um chef de cuisine tão bom quanto foi pintor, engenheiro, escultor, cartógrafo, projetista, inventor, nossa, a comida devia ser dos deuses!

Fico imaginando se existisse internet, blog, orkut e afins já naquela época, será que ele teria uma coluna semanal aqui no Enoeventos, com dicas de vinhos e harmonizações mil, e nós, simples mortais, o seguiríamos o tempo todo no twitter dele??? :o)

Gostaria de saber qual a fonte de pesquisa dessa sua coluna, é de algum livro específico? Já li uma biografia bem interessante (e como não ser?) de Leonardo da Vinci escrita por Richard Friedenthal (Editora Zahar), mas que eu me lembre, não mencionava nada sobre mais esse dote culinário do gênio.

Bem, já estou esperando a próxima coluna.

Abçs,
Vania
Reinaldo Paes Barreto
Enófilo
Rio de Janeiro
RJ
18/08/2009 Vania, você me sensibiliza com a sua gentileza (de responder) e surpreende pela curiosidade.

Vamos lá: quando eu estive em Florença, há 2 anos, descobri uma tradução do Codex Romanoff (em francês) e fiquei, então, atento a tudo o que dissesse respeito a Da Vinci "cozinheiro". Daí as informações deste meu post de hoje. Há receitas: ele adorava, por exemplo, ostras frescas que ele tisnava com um filete de azeite e colocava no forno; outras, sem graça. Outras, curiosas, como testículos de carneiro.

Mas o melhor dele não são as receitas, é o raciocínio-gourmet e o arquiteto do/a "mise-en-place".

Bjs e obrigado pelo comentário.
Reinaldo
Alexandre Lalas
Rio de Janeiro
RJ
18/08/2009 Reinaldo, meu amigo

Eu sou seu fã!

Forte abraço
Lalas
Abilio Cardoso Jr
Dentista e enófilo
Brasília
DF
18/08/2009 Grande matéria. As evoluções de Da Vinci na gastronomia já renderam até uma peça de teatro no Rio.
Abilio
Vania Moreira
Aluna do curso básico da ABS
Rio de Janeiro
RJ
19/08/2009 Olá Reinaldo,

Pesquisando no Google descobri que o Codex Romanoff rendeu um livro em português, editado pela Record em 2002, com o título de "Os Cadernos de Cozinha de Leonardo da Vinci". Nele há receitas no mínimo exóticas, tais como sopa de cavalo, pudim de mosquito branco(?), pastel de abelha, urso cozido!!! Apesar das excentricidades culinárias, acho que vale ser lida pelo relato histórico da época.

Outra coisa: queria saber como o Abílio, de Brasília, soube da peça (A Insólita Cozinha de Leonardo Da Vinci), que foi encenada aqui no Rio de Janeiro em 2007, no Teatro do Planetário, na Gávea, simplesmente do lado da minha casa, e eu não soube?!

Abçs,
Vania
Marcos Lima
Sommelier
Rio de Janeiro
RJ
19/08/2009 Reinaldo, assim como o Lalas eu também sou seu fã.

Abraços
Aguinaldo Aldighieri
Enófilo
Rio de Janeiro
RJ
19/08/2009 Caro Reinaldo

E nos intervalos... ele projetou também aquela magnífica escadaria dupla, em espiral, do Château de Chambord, no período em que viveu no Val du Loire.

Parabéns por seus artigos!
Aguinaldo
Valdir Siqueira
Publicitário
Rio de Janeiro
RJ
19/08/2009 Reinaldo, também sou seu fã, mas modestamente invoco direito de antiguidade.

Valdir
Renato Gonzalez Martiniano
Empresário
Rio de Janeiro
RJ
20/08/2009 Reinaldo,

Parabéns por mais uma matéria fantástica. A personalidade de Leonardo Da Vinci é um baú recheado de riquezas a serem exploradas, o que você fez de forma magnífica, nos trazendo fatos e curiosidades a respeito deste grande ícone do belo nas suas mais variadas formas.

Já fico ansioso por esperar sua próxima matéria, abraços.
Abilio Cardoso Jr
Dentista e enófilo
Brasília
DF
20/08/2009 Vânia, estive de férias por alguns dias no Rio nesta época. Infelizmente não pude assistir a peça, mas me recordo que fiquei curioso com a resenha falando das incursões de Da Vinci na gastronomia.

Abilio
Reinaldo Paes Barreto
Enófilo
Rio de Janeiro
RJ
21/08/2009 Mais uma vez agradeço à Vania Moreira, ao Abílio Cardoso, aos amigos Alexandre Lalas, Marcos Lima e Valdir Siqueira, ao Aguinaldo Aldighieri e ao Renato Martiniano, as palavras de apoio, os acréscimos ao que faltou dizer do Da Vinci e o carinho dos comentários.

Reinaldo
Cláudia Bulcão
Los Angeles
EUA
21/08/2009 Caro Reinaldo,

Não o conheço pessoalmente, mas uma vez no Rio, aliás chego dia 23, faço questão de conhecê-lo pessoalmente! VOCE É UM PLUS!!! Poderia escutá-lo durante horas, claro com um bom champagne, que você merece!!!

Grata pelo seu artigo, é um prazer saboreá-lo!!!!!
Ricardo Leite Hayden
Médico e enófilo engatinhando
Santos
SP
23/08/2009 Como sempre suas matérias são fora de série, um banho de cultura, história, curiosidades.

Continue assim, temos muito que curtir e aprender com você.
Roberto Cheferrino
Enófilo
Rio de Janeiro
RJ
24/08/2009
EnoEventos - Oscar Daudt - (21)9636-8643 - [email protected]