|
 O vinho e a gastronomia formam a primeira relação lógica no imaginário de qualquer pessoa (normal) de hoje em dia. Pudera, não há coluna, site, blog, portal como este nosso EnoEventos que fale de um, sem associá-lo(la) ao outro.
No entanto, o vinho é um belíssimo parceiro da constelação musical. Porque assim como bastam algumas poucas notas para que Debussy crie uma atmosfera musical sutil e envolvente, bastam os primeiros goles de uma degustação – se for um bom champagne, por exemplo - para que se possa "cantar", como o monge Dom Pérignon quando o provou: "Estou bebendo estrelas!"
Mas há infindáveis harmonizações que bocas e ouvidos treinados são capazes de orquestrar. Do tipo: o vinho branco Chablis está para as ostras, como o Champagne está para "Night and Day", tocado por Cole Porter; ou um Grand Cru de Bordeaux está para um Camembert, como um Porto Vintage está para o canto gregoriano da missa de domingo no Mosteiro de São Bento. E esse parágrafo é da lavra do Marcelo Copello.
Bom, mas como é que nasceu o hábito de se brindar?
Dizem que Dionísio, estranhou a ausência do "sentido audição" na seqüência dos outros quatro sentidos provocados pela liturgia de provar um vinho. Confiram: começa-se pela visão, a seguir vem o tato, depois o olfato e chega-se finalmente ao paladar - mas cadê o ouvido? O Baco grego inventou, então, o brinde, sonorizado, a princípio, só pelo tilintar das taças. Mas o ser humano é compulsivo e esse beijo dos metais/cristais começou a "soar" insuficiente.
Aí, alguém – um romano, um espanhol? – resolveu preencher o silêncio com votos de "saúde", o que na geografia dos idiomas se traduziu para "santé" (ou "salut", em francês, já que deixa a boca no formato ideal para receber pequenas quantidades de bebida); "salud", para os castelhanos e "salute", para os italianos; "prosit", para os alemães; "proost", para os holandeses e "cheers" para os anglos. Os russos dizem "zdorov" e os árabes (que bebem) dizem "fisihitaek"; os judeus e toda a família dizem, em uníssono, "l´chayim!" e, em grego, brinda-se dizendo "steniyasas". O mais curioso, contudo, é a saudação dos nórdicos: ao levantarem suas taças, dizem "skäl", que significa, literalmente, "caveira". E a origem vem do costume viking de beber cerveja nos crânios de seus inimigos, esvaziados e limpos como se fossem canecos.
Ou seja: registrar "o instante do beber" e as circunstâncias desse momento – a presença do bem-querer: amor, amigos – faz parte de um ritual festivo que todo bebedor conhece. Aguça o paladar dos presentes, torna as qualidades do líquido ainda mais extraordinárias e transforma cada ocasião em um evento singular.
Proponho, no entanto, duas alternativas para o nosso clássico saude:
quando um homem e uma mulher se sentirem "em estado de fusão", devem esquecer todo o planeta em torno e se dizerem, com egoísmo: "A nós que nos bastamos!"
quando o vinho (espumante, branco, rosé ou tinto) for bom e, naquele momento, todas as outras circunstâncias da vida estiverem apaziguadas, o brinde há de ser: "Que o supérfluo nunca nos falte!" |
|
|