"LF""LF""LF""LF""LF"
Matérias relacionadas
Colunistas
 
Passei este fim de semana em São Paulo e, obviamente, estive em alguns bons restaurantes. Aliás, um parêntesis: cada vez que vou lá, mais me convenço do acerto de uma "sacada" minha, há dois anos, quando fui "o orador" das comemorações pelo 15º aniversário da Revista Gula.

Como estava explícito que eu falava ali pela "gastronomia do Rio", resolvi provocar: "Sabem qual é a maior diferença entre um restaurante estrelado em São Paulo e o seu similar no Rio? É que nesse X, da capital paulista, se o maître ou o garçom chamarem o cliente pelo nome, ele nunca mais põe os pés lá. Já no Rio, se acontecer a mesma coisa, ele nunca mais... sai de lá! Porque nós, cariocas, somos pessoas físicas o tempo todo. O Volkmar, da casa da Suiça, chama o nosso governador de "seu Sérgio", por exemplo. Agora imaginem o Atala chamar o de lá de "seu Zé"!!!

Mas vamos ao assunto em título, como dizem os burocratas de Brasília. No primeiro dia, da primeira aula do curso básico de sommelier se ouve a advertência: vinho e chocolate são como o sol e a lua. No entanto, não é bem assim. Até porque os "contendores" se conhecem há muito tempo. O vinho é quase mais velho do que a história. E o chocolate também vem de longe, quinhentos anos, por aí. Originário do México, onde os astecas o preparavam de forma líquida, foi levado para a Espanha, por Cortez, em 1528. E tornou-se popular em toda a Europa no século seguinte.

Mas o formato em barra, tablete ou ovo, como é conhecido hoje, surgiu na Inglaterra, em 1847, produzido pela Fry & Sons e nunca mais parou de conquistar novos chocólatras: só no ano passado, foram produzidos, no mundo, 5,3 milhões de toneladas de chocolate. E agora surgem os "chocolates de origem", ou seja, assim como nos vinhos varietais (feitos com uma só variedade de uva), são elaborados a partir de um único tipo de semente de cacau, exclusiva das maiores regiões produtoras, que são: Java, Tanzânia e Santo Domingo.

Mas voltemos à problemática do título: como harmonizar vinho e chocolate? Vejamos as indicações dos profissionais:

Primeira hipótese: Vinho do Porto. Pelo seu teor alcóolico e doçura, um Tawny envelhecido é o acompanhamento ideal para um chocolate ao leite, enquanto um Ruby é a boa pedida para os mais amargos. Outras possibilidades: o Jerez, como fazem os espanhóis, ou Sherry, como preferem os ingleses; ou os vinhos de sobremesa, como apreciam os franceses. Deles, temos o magnífico Sauternes, cor de ouro velho, ou o Banyuls, também do sul da França ou, ainda, o Muscat Beaumes de Venise, um néctar que se serve na Provence com os chocolates e petit-fours que encerram as copiosas refeições de domingo. (Não é por acaso que os papas ficaram por lá 70 anos!)

Aí os americanos - claro! - criaram dois vinhos feitos sob medida para o chocolate: o Deco Port Chocolate, um fortificado tipo Porto, feito na Califórnia, que recebe chocolate em estado natural na sua composição e o Orange Muscat, também californiano, que como o nome indica vai muito bem com chocolate que leva laranja.

Cabe a nós, consumidores - portanto - resolver essa contradição: tentar harmonizar o chocolate, cuja doçura extrema e textura untuosa "arrebata" as papilas, com o vinho, que fica, assim, e teoricamente, em segundo lugar na boca. Ou seja: incapaz de provocar as sensações que lhe são peculiares.

E para os que não se convenceram com as alternativas acima, sugiro uma terceira via: abrir uma bela garrafa de champagne, ou de espumante bem produzido, e convidar a família, e os amigos - juntos ou em separado - para saudar o milagre do encontro, a energia de uma comemoração, o milagre rotineiro da vida em ciranda de afeto.

E, depois de um belo copo de água mineral dessas, bem feitas, acompanhar os chocolates com café, que até por ser tomado quente, derrete melhor o doce. Chá também serve.
 
Comentários
Fernando Zamboni (Zamba)
Enófilo e Sommelier
Caxias do Sul
RS
03/11/2009 Aproveitando a deixa de Reinaldo Paes Barreto, eu também aprendi em meu curso de sommelier que vinho e chocolate não harmonizam entre si.

No entanto não posso deixar de mencionar que tive a oportunidade de degustar um vinho fortificado maravilhoso que cumpriu seu papel perfeitamente ao harmonizar com chocolate negro 70% de cacau. Não falo de um vinho estrangeiro e nem de um vinho caro como possam imaginar, mas sim do PORTENTO, um vinho fortificado produzido nos moldes dos vinhos do Douro pela Quinta Santa Maria, de São Joaquim - SC. É elaborado com Cabernet Sauvignon e Merlot, com pequena parcela de castas portuguesas como Touriga e Aragonez, colhidas em vinhedos de altitude entre 1200 e 1400 metros. Foi envelhecido por seis meses em barricas de carvalho francês, é macio e bem equilibrado. Sem dúvida uma grande novidade no mercado e além de tudo, um produto brasileiro. Aconselho a todos.

Em relação ao comentário de ser chamado pelo nome pelo garçom ou pelo maitre, quero dizer que aqui no sul quando isso acontece a gente prolonga o jantar até que os mesmos possam se sentar conosco e degustar uns bons vinhos juntos.
Reinaldo Paes Barreto
Enófilo
Rio de Janeiro
RJ
04/11/2009 Agradeço ao Zamba, de Caxias do Sul, a dica de um vinho fortificado de bom preço para enfrentar o chocolate (e o "apoio" ao hábito carioca de nos entendermos bem como garçons e com maîtres).

E, com uma semana de atraso, ao Eduardo Tlach, professor - bar/enologia/SENAC de Sto. André, em SP e ao Fernando Sequeira de Matos, enófilo lá da Mealhada, na Bairrada, no meu querido Portugal, os oportunos comentários com relação ao meu post O Vinho Brasileiro. Continuem mandando torpedos, prezados amigos!
Alexandre Lalas
Jornalista
Rio de Janeiro
RJ
04/11/2009 Mestre Reinaldo

Embora a combinação entre vinho e chocolate nunca seja fácil, gosto da harmonização feita pelo pessoal do Sul da França com Maury. Acho bem bom.

Abraços
Lalas
José Luis Azeredo
Enófilo
São Paulo
SP
04/11/2009 Sucinto, claro, direto ao assunto, é assim que o autor dá as diretrizes para vinho X chocolate e deixa para o leitor a decisão de escolher. Excelente.

Dois adendos:

  • Vinho do Porto LBV, tem mais estrutura e dulçor para acompanhar chocolate amargo. Há chocolates que até merecem um Vintage de Quinta.

  • De Jerez e Malaga, os PX (Pedro Ximenes) e alguns moscateis, são doces o suficiente para chocolate; as outras variantes, ás vezes no nariz até parecem combinar, mas morrem na boca.

    um []
    Azeredo
  • Fernando Sequeira de Matos
    Enófilo
    Mealhada
    Bairrada
    Portugal
    04/11/2009 Aí vai a minha dica:

    Para mim os chocolates são belgas. Adoro comer chocolates na Grand Place depois de um bom bacalhau no Chez Manuel. Nunca tinha pensado na harmonização e como quem vai para a Bélgica deve levar o seu vinho ou bebe cerveja também não se pôs a questão.

    Vou experimentar com um Moscatel de 20 anos do Douro. Se houver chocolates no Rio, levo o moscatel para experimentarmos ... e vai ser este mês.

    OK
    Um abraço
    Fernando
    EnoEventos - Oscar Daudt - (21)9636-8643 - [email protected]