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 Com o fim do Império Romano, ao qual se seguiu um período de obscurantismo e retrocesso da marcha da humanidade, a Igreja Católica passou a ser, de certa forma, a depositária dos conhecimentos. E dos hábitos - strictu e latu sensu! E, por conta disso, os mosteiros se multiplicaram no cimo das colinas, se apropriaram de muitas terras de viticultores arruinados e incorporaram o vinho a seu patrimônio - religioso (o sangue de Cristo), comercial e... lúdico. Beneditinos e franciscanos, sobretudo, garantiram e aperfeiçoaram o cultivo da vinha e a produção do vinho na Idade Média. Além de cultivarem, também, a horta, a granja e o pomar, moinhos e oficinas, já que os mosteiros precisavam se auto-sustentar, para que os monges não necessitassem "ir lá fora" buscar o sustento de suas corporações.
Mas na França, mais do que em qualquer outro lugar do mundo, o vinho ocupava um espaço à parte no job description dos religiosos. E o case de Dom Pérignon é o mais expressivo. Monge beneditino da Abadia de Hautvilliers, perto de Épernay, foi ele quem primeiro experimentou o processo de uma segunda fermentação do vinho na garrafa - méthode champenoise - descobrindo, em 1670, o vinho-borbulhante que batizou com o nome da região: champagne.
O remake foi o seguinte: naquela época, as garrafas eram tapadas com um pino de madeira, envolvido por uma estopa embebida em azeite. À procura de um processo mais limpo e mais estético, Dom Pérignon teve a idéia de derreter cera de abelha no gargalo das garrafas, assegurando-lhes uma melhor vedação. Ao fim de algumas semanas, algumas garrafas explodiram, deixando o nosso monge perplexo. Examina daqui, analisa dali, ele compreendeu que o açúcar contido na cera, em contato com o vinho, tinha provocado uma segunda fermentação, gerando uma brusca efervescência e, consequentemente, um exponencial aumento da pressão de dentro para fora, fazendo as garrafas voarem das prateleiras!
Santé: estava inaugurada a mais fascinante, duradoura e festejada corrente vertical de pérolas de álcool da história do vinho. O próprio Dom Pérignon, ao provar o seu experimento, teria declarado: "Estou bebendo estrelas!" Além disso, ele foi aperfeiçoando a sua invenção, misturando diferentes castas e diferentes safras a fim de obter uma qualidade final que superasse a excelência de cada uma das castas participantes. Tanto que o champagne clássico é feito de duas uvas tintas: pinot noir e pinot meunier e só uma branca: a chardonnay.
Dom Pérignon morreu velho para a época - 77 anos - e cego. Ou melhor: não morreu. Renasce em cada garrafa que a cada minuto espouca em algum lugar do planeta, para brindar o poder, o amor, a vitória e o dinheiro. É a bebida da ereção, da taça acima da cabeça - quando não dentro da cebeça! |
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