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Entrevista com o enólogo Rui Reguinga


Prezados leitores,

Na manhã de 15 de agosto, encontrei o cultuado enólogo Rui Reguinga, para conduzir uma entrevista com ele, oferecendo a vocês, dessa forma, a possibilidade de conhecer um pouco do estilo desse que é conhecido como o Enólogo Voador Português.

Foram momentos muito agradáveis em que pude entender a filosofia de trabalho do enólogo, saber dos vários projetos que ele gerencia pelo mundo afora e, claro, conhecê-lo como a pessoa simpática, inteligente e determinada que ele é, sempre perseguindo seus objetivos de forma bastante pragmática.

Mas, bem melhor do que conhecer a teoria de Rui, foi à noite, saborear suas obras, em uma degustação da Importadora Cupello Wines, realizada na ABS do Flamengo e apresentada pelo próprio enólogo.

Daí sim, pude ver que o discurso de Rui faz o maior sentido!

Um abraço,

Oscar Daudt
EnoEventos Rui Reguinga
Quem é o enólogo Rui Reguinga? Nasci em 1966, em Almeirim, no Ribatejo, e desde os 5 anos estive ligado com os vinhos, pois costumava pisar no lagar de meus avós e meus pais. Sempre almejei seguir a carreira nessa área, primeiramente pensando em ser agrônomo, para cuidar das vinhas e, posteriormente, decidindo estudar enologia.

Fiz um bacharelado na Escola Superior de Santarém e depois fiz o Estudo Superior de Agronomia em Lisboa, me formando em Engenharia Alimentar, com especialização em Viticultura. Mais tarde, fiz uma pós-graduação na Universidade Católica do Porto, em Marketing dos Vinhos.

Quando comecei a trabalhar, minha primeira vindima foi como estagiário em uma vinícola em Champagne, em 1990. Quando voltei a Portugal, tive a oportunidade que foi decisiva em minha vida: um convite para trabalhar com João Portugal Ramos, que iniciava uma empresa de consultoria. A empresa prosperou e, em 4 anos, já tínhamos mais de 20 clientes.

Em 2000, resolvi iniciar a minha própria empresa e tomei a decisão estratégica de começar viajando muito ao exterior. Fui à Austrália, Nova Zelândia, Califórnia e praticamente toda a Europa. E logo surgiram contratos no exterior, o primeiro deles exatamente aqui no Brasil, no Vale do São Francisco, e em seguida na Argentina.
Quais as vinícolas para as quais você trabalha? Bem, no Dão, trabalho com a Quinta dos Roques e a Quinta das Maias.

No Ribatejo, com a Casa Cadaval e a Tributo, um projeto pessoal meu.

Nas Terras do Sado, com a Herdade de Espirra.

E no Alentejo, trabalho com a Herdade do Gamito, Terras do Crato, Pedra Basta (um projeto meu em parceria com Richard Mason, um jornalista inglês), o Terrenus (um vinho meu), o Monte da Esperança, o Lima Mayer, o Monte da Ravasqueira, o Paço do Conde e a Fonte de Aviz.

Na Argentina, trabalho com o Domaine Vistalba e na Áustria, tenho uma parceria com um amigo para a criação de um Late Harvest que vendemos em Portugal.

"Eu faço vinhos que agradem ao consumidor
final e identifiquem o terroir."

Trabalhando com tantas empresas, você consegue manter a identidade de cada uma delas em seus vinhos? Eu faço vinhos para duas pessoas: o consumidor e o produtor. A marca é do produtor e eu tenho de seguir o estilo que o produtor quer imprimir a seu vinho, mas confesso que grande parte deles se apóiam muito em minha experiência e minha consultoria.

Mas é claro que cada enólogo tem seu estilo próprio e o mesmo sempre termina aparecendo nos vinhos produzidos. Eu procuro sempre fazer vinhos que agradem ao consumidor final e identifiquem o terroir.

Na Argentina, por exemplo, eu fui contratado para desenvolver um vinho para o mercado inglês. É um vinho com cara de Novo Mundo, mas o que eu faço naquele país não é muito diferente do que eu faço em Portugal: um vinho moderno, com boa fruta, com a madeira não se sobrepondo ao vinho, mas que identifica a casta e a origem.
O termo enólogo-voador veste bem em você? Bem, esse termo tem sido muito utilizado pela imprensa de meu país porque, na verdade, eu sou atualmente o único enólogo português a dar consultoria no exterior. Mas eu não uso esse termo como uma estratégia de marketing.

Posso assegurar, entretanto, que acho maravilhosa o oportunidade de fazer vinhos na Argentina, onde estão os melhores consultores do mundo, como o Michel Rolland, o Paul Hobbs.

Minha participação naquele país foi muito positiva em termos técnicos, pois conseguimos evoluir os vinhos para um estilo mais internacional, o que resultou, por exemplo, no fato de o Fabre-Montmayou Grande Reserva Malbec 2005 ganhar o troféu de "Melhor Malbec da Argentina", em concurso realizado em Mendoza com juri internacional.

De qualquer forma, grande parte do meu trabalho é desenvolvida em Portugal, mesmo. E lá, o meu envolvimento com os vinhos produzidos é bem maior do que o de um enólogo consultor.

"A Malbec na Argentina é a casta certa no lugar certo.
Ainda pretendo fazer experiências com ela em Portugal"

Onde é mais fácil fazer vinhos de qualidade: na Argentina ou em Portugal? A Argentina tem uma vantagem que é a adaptação excepcional da casta Malbec ao clima de Mendoza e a versatilidade da mesma, que permite fazer tanto vinhos fáceis para o dia-a-dia, quanto um Grande Reserva, que impressiona pela estrutura, pelos aromas e sempre com os taninos muito suaves. É a casta certa no lugar certo! Eu ainda pretendo fazer experiências com essa casta em Portugal, possivelmente no Alentejo.

Já em Portugal, as castas autóctones são mais difíceis de trabalhar. A Touriga Nacional é uma casta excelente, possivelmente a melhor que temos, mas em termos de viticultura é uma casta muito complicada, selvagem, e em termos de enologia permite fazer grandes vinhos, de guarda, embora difícil de se fazer vinhos para o dia-a-dia.
Você que já prestou consultoria no Vale do São Francisco, acha que esse vale tem potencialidade para se tornar uma região vinícola respeitada? Essa região tem o potencial para fazer bons vinhos, mas duvido que se torne a grande região brasileira. Com a extensão territorial brasileira, com a diversidade de solos, penso que a grande região vinícola do Brasil ainda está por ser descoberta.

No entanto, o Vale do São Francisco tem seu apelo mercadológico por ser a única região do mundo situada no paralelo 8 e isso poderia ser bem explorado pelo Brasil.
De todos os seus vinhos, qual é aquele que secretamente é o seu preferido? Essa é uma pergunta complicada. Eu tenho uma dificuldade pessoa de dizer qual o melhor vinho do mundo, qual o melhor vinho para mim. Mas o meu vinho preferido é um vinho de um projeto pessoal, muito pequeno, são apenas 2.000 garrafas. Não é o meu preferido por eu achar que é o melhor vinho do mundo, mas sim porque é um projeto sentimental, plantado em 1 hectare que meu pai me deu para eu brincar, no ano de 2001, no Ribatejo, e onde plantei apenas castas do Rhône: Syrah, Grenache, Mourvèdre e Viognier. Como meu pai faleceu no meio do projeto, resolvi batizar o vinho de Tributo, em homenagem a ele.
Não parece um contra-senso, tendo Portugal a quantidade imensa de castas autóctones que tem, você fazer um vinho apenas com castas estrangeiras? Eu sou um pouco assim: quando todo o mundo vai por um caminho, eu procuro encontrar um caminho diferente.

"Eu nunca compro vinhos para beber sozinho.
Costumo sempre dividí-los com meus amigos."

Sem contar os seus próprios, de onde vêm os vinhos de sua adega (nota: garrafeira, para os portugueses)? Eu essencialmente tenho em minha garrafeira vinhos estrangeiros. A minha garrafeira foi evoluindo junto comigo. Inicialmente eu tinha muitos vinhos do Novo Mundo, muita Austrália, Califórnia, Nova Zelândia, Argentina, Chile, e nos últimos anos está evoluindo para os vinhos europeus, sendo que ultimamente tenho muitos Pinot Noir da Borgonha. Mas tenho também vinhos de Bordéus, da Itália, muitos do Rhône, do Priorato. E de Portugal, tenho vinhos que troco com meus colegas, mas principalmente do Douro e do Alentejo.

Mas eu nunca compro uma garrafa para beber sozinho. Costumo sempre dividir os vinhos com meus amigos e com meus colegas de profissão, com os quais troco muitas idéias.
Até poucos anos atrás, Portugal era reconhecido apenas com um produtor de Vinhos do Porto e da Madeira. Subitamente, a qualidade dos vinhos portugueses deu um grande salto e o mercado internacional imediatamente reconheceu esse novo fenômeno.

Como você avalia essa mudança tão drástica?
Por um lado, decorre da formação dos enólogos portugueses de minha geração, que há 10 anos atrás começaram a viajar pelo mundo e a perceber que o estilo dos vinhos tinha que mudar. Aqueles vinhos rústicos, com taninos muito duros, pouca fruta, vinhos para beber velhos, não poderiam mais continuar.

Por outro lado, as próprias vinícolas evoluiram, nem sempre por vontade, mas às vezes por necessidade. Aquelas que não evoluiram, ficaram pelo meio do caminho.

Houve também muitos empresários, não ligados à área do vinho que quiseram investir nesse setor e tiveram de partir do zero. Quando se parte do zero, se faz tudo bem feito: vinhedos plantados conforme a orientação do enólogo, adegas projetadas pensando no estilo de vinho que se deseja produzir.

E nos últimos 5 anos, a aceitação dos vinhos portugueses pelo mercado internacional aumentou muito e a própria imprensa especializada passou a reconhecer a grande melhoria de qualidade dos vinhos portugueses.
Comentários
Teresa Cristina
[email protected]
Rio de Janeiro
RJ
21/08/2008 Oscar!!!

Parabéns pela entrevista! Importante saber o quanto de paixão e sentimento um enólogo coloca em seus projetos!!!

Excelente as "frases-destaque"!!
Carlos Jorge
Lisboa
Portugal
22/08/2008 Parabéns Oscar pela entrevista a uma das pessoas que mais tem feito pela qualidade do vinho português.

Um abraço para o grande Rui.
Fernando de Oliveira
[email protected]
Rio de Janeiro
RJ
28/08/2008 Sem palavras para expressar a qualidade da entrevista. Foi aos pontos exatos.

Um abraço,
Carla Adriana
[email protected]
05/10/2008 Parabens pela entrevista.

Historia de sucesso e envolvimento pelo que faz. Eu como confreira amo saber mais sobre historias como a sua!

Sucesso.
Suely Bianchi
Enófila
Recife
PE
20/11/2011 Parabens Rui, tenho atualmente me interessado pelas leituras sobre vinhos ( gostava de entendr um pouquinho mais) e lendo sua entrevista dou-te os parabens e desejo sucesso.

Caro Oscar, parabens pela entrevista com o Rui e pela pesquisa de preço nas cartas de vinho em São Paulo e Rio. Olha não esqueça que aqui no Nordeste precisamos algo parecido.

Suely
Sergio Fernandes
Hannover Vinhos
Belo Horizonte
MG
26/12/2011 Parabens Oscar, pela bela entrevista e gostaria de ressaltar como representante da HANNOVER VINHOS em Minas Gerais, que somos os importadores no Brasil do PEDRA BASTA e TERRENUS, vinhos deste talentoso e conceituado enólogo português.
EnoEventos - Oscar Daudt - (21)9636-8643 - [email protected]