
Até alguns anos atrás, era obrigação legal que os Vinhos do Porto, apesar de usarem uvas plantadas no Douro, fossem elaborados em Vila Nova de Gaia. Com isso, apenas as grandes casas produtoras lá instaladas podiam engarrafar e exportar os vinhos, mantendo um lucrativo oligopólio. Como essas casas compravam as uvas de muitos viticultores (existem cerca de 30.000 deles no Douro), misturava-se tudo. Vinhos de Quinta, nem pensar...
Mas em 1986, a lei foi alterada de forma a permitir que os plantadores pudessem produzir e comercializar seus próprios rótulos. Isso representou uma revolução naquele mercado empoeirado e privilegiado. Muitos pequenos produtores passaram a oferecer seus próprios vinhos, de quintas específicas e houve uma estupenda diversificação.
A Casa de Santa Eufemia (CSE) foi uma dessas quintas que rapidamente passaram de meros plantadores a vinícolas-boutique, trazendo novas opções para os enófilos apaixonados por esse tão decantado vinho. Essa vinícola já tem seus vinhos exportados para o Brasil através da Adrimar Importadora e os executivos da empresa foram conhecê-la. E eu junto...
Os vinhos da Casa de Santa Eufemia |
A recepção ao grupo foi primorosa, com requintes de delicadeza. O jantar foi oferecido na própria casa dos patriarcas da família, José e Maria do Céu Viseu de Carvalho, tendo sido caprichosamente preparado pela anfitriã. O Arroz de Pato de D. Maria do Céu era excepcional, delicado, saboroso, de deixar o Antiquarius enrubecido. E o jantar foi a deixa para a apresentação dos vinhos.
Uma homenagem à dona da casa, o branco Maria do Céu 2009 foi um delicioso começo. Fiquei um tanto em dúvida para escolher o melhor tinto: era ou o Viseu de Carvalho Tinto 2006 ou o Compota Touriga Nacional Grande Reserva 2007. O primeiro é elaborado com as 5 Ts (Touriga Nacional, Touriga Franca, Tinta Carvalha, Tinta Barroca e Tinta Roriz), mas afinal prevaleceu a minha queda pela Touriga Nacional, que considero a melhor casta portuguesa, e me decidi pelo varietal.
E para acompanhar as compotas caseiras, foram servidos dois Casa de Sta. Eufemia Porto, um com 10 anos, o outro com 40 anos. Desnecessário dizer que o de 40 anos era excepcional. De cor âmbar escuro, era um vinho intenso, gordo, com complexos aromas de nozes, ameixas pretas, chocolate e canela e um delicioso e prolongado final. Ou melhor, copiando a descrição da empresa, "não tem um final longo, mas sim eterno".
A curiosa história do Porto Branco Velho |
Em 1974, Portugal vibrou com a Revolução dos Cravos, que acabou com uma ditadura de 40 anos. Na turbulência subsequente, a economia enfrentou dias complicados e nessa confusão, a CSE, que à época vendia sua produção às grandes casas engarrafadoras de Vila Nova de Gaia, ficou com parte da produção de 1973 encalhada, incluindo um grande estoque de vinho branco, esquecido nas caves da empresa.
Há alguns anos, o envelhecido estoque foi descoberto e a CSE decidiu engarrafá-lo como Casa de Sta. Eufemia Porto Special Reserve White 1973 - um tipo que nem o IVDP sabia como classificar - e tem recebido demonstrações de surpresa e admiração do todos os que o provam. Pudera, é realmente sensacional! A cor âmbar impressiona e seus aromas de mel, especiarias e avelãs são deliciosos, prenunciando uma boca bem equilibrada entre a doçura e a acidez. Meu conselho: não morra antes de prová-lo...
Uma das vinícolas a prospectar pela Adrimar Importadora durante a viagem foi a Quinta do Louridal, uma exclusiva e familiar quinta localizada na região de Melgaço. A idéia inicial do grupo era ir até o Minho para conhecer a propriedade, mas a escassez do tempo mostrou que seria inviável essa desvio. Se Maomé não pôde ir à montanha, a montanha veio a Maomé, e a bela e suave Sofia Beatriz Silva, em boa hora, juntou-se a nós no jantar da CSE para apresentar seu vinho.
Sofia produz apenas 10.000 garrafas de um único rótulo, o Poema Alvarinho, um vinho que repousa 12 meses sobre as borras e depois mais 12 meses em garrafa, para resultar em um dos melhores exemplares dessa casta que já provei. Aromas de pêssego e toques minerais, com excelente estrutura, equilíbrio e viva acidez é um vinho encantador que bem demonstra o potencial dessa casta quando tratada com cuidado e carinho. Felizmente, um passarinho me contou que as negociações para a importação desse vinho chegaram a bom termo e eu espero que em breve possa estar matando as saudades desse vinho especial!
Oscar Daudt |