 |
Matérias relacionadas |
Itália Viagens |

Para um apreciador inveterado de vinhos brancos, a semana que passei visitando as vinícolas da região italiana do Friuli - ou Friuli Venezia Giulia, como queiram - foi uma das mais deliciosas passagens de minha vida de enófilo. Em praticamente todas as degustações, os vinhos brancos reinavam absolutos.
Com uma variedade de castas brancas autóctones e internacionais, vinificadas como varietais ou em corte, os vinhos são de altíssima qualidade e a região é reconhecida internacionalmente como o endereço dos melhores vinhos brancos italianos. Lá existem vinhos tintos também, com algumas castas autóctones virtualmente desconhecidas pelo mercado global, mas esses não têm o mesmo prestígio de seus compadres brancos. Parece-me mesmo que o Friuli deveria concentrar seus esforços de exportação nos vinhos brancos, deixando os tintos apenas para o consumo local.
Os brancos varietais são exuberantes, mas é nos cortes que a região se destaca, apresentando alguns dos melhores vinhos brancos do mundo. No entanto, no Brasil, seus vinhos são ilustres desconhecidos e contam-se nos dedos de uma só mão os produtores que são trazidos para nosso mercado.
Mas a região está querendo conquistar o Brasil, apostando que seus vinhos brancos são a harmonização ideal para nosso clima tropical. É claro que essa pretensão esbarra em nosso consumo reduzido de brancos. Eu, no entanto, responsável por alguns pontos percentuais do consumo desses vinhos, mostrei a eles que, em lugar de ser uma barreira, o baixo consumo era na verdade uma oportunidade. O campo está aberto para quem primeiro conseguir mostrar aos brasileiros a adequação dos mesmos para nosso estilo de vida descontraído e "caliente".
Isso me faz lembrar de uma excelente coluna que Marcelo Copello publicou em nossas páginas: 10 motivos para gostar de vinhos brancos. Vale a pena reler clicando aqui. O Friuli agradecerá...
|
A região do Friuli é dividida em 10 DOC's e 3 DOCG's, em uma arrumação complicada que inclui superposições e denominações inter-regionais. O mapa à direita apresenta a divisão dessas denominações (clique na imagem para apresentá-la em tamanho grande). As mais importantes - pelo menos em nossa viagem - são:
A região do Isonzo fica localizada em uma área plana delimitada pela montanhas do Collio e do Carso e cortada pelo cristalino rio Isonzo. A DOC é dividida em duas áreas: a Rive Alte e a Rive di Giare, cujos solos apresentam características bem distintas. Conta atualmente com mais de 60 produtores. Em termos de castas, não há muita restrição, cabendo na DOC praticamente todas as castas do Friuli. No entanto, surpreende saber que a Ribolla Gialla, tão comum por lá, não é autorizada para a DOC.
O Collio é uma pequena DOC localizada entre as DOCs Colli Orientali e Isonzo, tendo a Eslovênia como limite oriental, com muitos de seus vinhedos se estendendo para aquele país. Dizem que as uvas plantadas no país vizinho não podem receber a denominação. Dizem... Em seus domínios as castas brancas predominam na proporção de 85%. As variedades brancas podem ser qualquer uma das aceitas no Friuli, mas quanto às tintas, apenas as internacionais Merlot, Cabernet Franc e Cabernet Sauvignon são autorizadas.
DOC Colli Orientali del Friuli | Criado em 1970, o Consorzio dessa DOC foi um dos primeiros a ser estabelecido em toda a Itália. A DOC fica localizada na área montanhosa da província de Udine, com altitudes que variam de 100m a 350m. A região possui cerca de 200 associados, sendo 150 deles engarrafadores de seu próprio vinho. Não há restrições de castas, podendo ser utilizadas todas as castas autóctones e estrangeiras autorizadas para o Friuli. A colheita deve ser feita manualmente, apenas. Dentro do território da DOC, encontram-se as DOCGs Picolit, Ramandolo e Rosazzo.
Em contraste com as demais denominações, esta DOC é mais voltada para e elaboração de vinhos tintos, invertendo o percentual de produção para 80% de tintos e 20% de brancos. As castas tintas autorizadas são: Terrano, Refosco dal Pedunculo Rosso, Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc e Merlot. As castas brancas podem ser: Traminer, Vitovska, Malvasia, Chardonnay, Pinot Grigio e Sauvignon.
|
Um passeio pelos vinhos do Friuli revela uma grande quantidade de castas, autóctones ou não, utilizadas em cortes ou como varietais. Das castas brancas, afora as "estrangeiras" Sauvignon, Pinot Bianco, Pinot Grigio e Chardonnay, encontramos as seguintes:
Tradicionalmente conhecida na região como Tocai Friulano, esta casta teve de ser rebatizada, atendendo a reclamações da Hungria sobre a semelhança semântica com a região de Tokai, muito embora os vinhos fossem infinitamente distintos e nem ao menos utilizassem a mesma uva. Bem, os rótulos foram atualizados, mas o nome Tocai continua em todas as bocas e sua popularidade não pára de crescer. Elabora vinhos de alta qualidade, com excelente estrutura, delicados aromas florais e de maçã, e um final com toques amendoados. É considerado o parceiro ideal para o presunto San Daniele, delicada iguaria produzida na região.
Outra das variedades emblemáticas da região, é utilizada para a elaboração de estilos diversos. Como vinho jovem, é delicado, floral e de ótima acidez. Utilizando-se a maceração das cascas e envelhecimento em carvalho, elabora vinhos profundos, complexos e intrigantes. E pode, finalmente, ser utilizado para a elaboração de espumantes, resultando em perlage finíssima com excelente potencial de guarda. A Ribolla dividiu com a Friulano as minhas preferências na região.
Elabora um vinho leve, condimentado, com aromas de frutas tropicais. É considerado como um "vinho para peixe", mas não me entusiasmou muito.
Casta delicada e agradável que oferece marcante acidez e aromas frutados (notadamente pera). Não sendo muito utilizada na região, não tivemos a oportunidade de provar nenhum exemplar dessa casta, mas eu trouxe na bagagem um garrafa de Skerk 2009, elaborada no Carso, com maceração das cascas e estágio em madeira. Quando provar eu conto as minhas impressões.
Das castas tintas, além das internacionais Cabernet Franc, Cabernet Sauvignon, Merlot e Pinot Nero, destacam-se as seguintes variedades autóctones:
Refosco dal Pedunculo Rosso |
O nome dessa variedade deriva da cor vermelha de seu pedúnculo. Casta emblemática da região, produz vinhos de alta acidez, cor profunda e taninos verdes.
Se a Refosco é tânica, o que dizer da Pignolo? Quando se experimenta um vinho jovem, o ataque tânico chega a murchar as bochechas, como se fosse um suco de caqui verde. No entanto, após uma guarda de 5, 10 ou até 20 anos, torna-se um vinho suntuoso, condimentado e os taninos se equilibram. Mas quem quer esperar tanto tempo?
Esta casta esteve em vias de extinção, mas está sendo recuperada e promovida na região. Seus característicos aromas de framboesa e pimenta, acompanham uma boca de corpo leve, baixos teores alcoólicos e elevada acidez.
Oscar Daudt
01/11/2012
|
|