
Há cerca de 2 meses, escrevi uma matéria contando da raridade que é, em terras cariocas, a possibilidade de se pedir um menu-degustação (clique aqui para recordar). Pois não é que uma das alternativas mais sensacionais estava bem debaixo do meu nariz (muito embora, do outro lado da ponte).
A Confraria Safari Gastronômico convidou-me a acompanhá-los em uma incursão a Niterói, para experimentar as artes e ofícios da gentil portuguesa D. Henriqueta Henriques e de seu filho Alexandre, que comandam a Gruta de Sto. Antônio. Eu conhecia bem a casa, mas não tão bem a ponto de saber que lá está disponível uma das melhores opções de menu-degustação do Rio e arredores: farto - na verdade, lusitanamente farto - caprichadíssimo, com ingredientes sofisticados e, consideradas as proporções, com um preço bastante honesto: R$240 por pessoa, para uma esbórnia de 10 pratos (e mais os bolinhos de bacalhau, não fotografados). É algo imperdível, mas só os fortes conseguem sobreviver até a última etapa.
Destacar um prato dos demais é tarefa árdua, pois mãe e filho estavam em tarde abençoada. Mesmo assim, chamo a atenção para a Cataplana de Cherne e Camarões, uma delicada iguaria; o Bacalhau do Chef, preparado com o colágeno do próprio, que vinha macio, no ponto de tudo e sobre batatas ao murro; grande sucesso fizeram também a Panelinha de lagostins com cogumelos e a Bruschetta de Sardinhas.
A casa tem uma das mais caprichadas cartas de vinho do Rio, com uma variedade de rótulos portugueses para satisfazer a todos os gostos e todos os bolsos. Mas Alexandre, em uma consideração à Confraria, deixou que os vinhos fossem trazidos de casa.
E só o que podia se nivelar às delicias que passavam pelos pratos, eram as preciosidades que se derramavam em nossas taças. Para não fazer feio, o grupo levou 8 vinhos portugueses especialíssimos e dois intrometidos, um francês e um italiano, ambos de fina estampa. Foram 10 vinhos para um grupo de 8 pessoas e, mesmo assim, não sobrou uma só gotinha nas garrafas e nem nas taças. Mas como estávamos de van, como exigem as modernas regras de etiqueta, todos se salvaram.
Como o próprio dono não estava levando fé, o primeiro vinho foi um Viognier português, da Estremadura, do longínquo ano de 2003. Pensou ele que era só abrir e descartar a garrafa, que já deveria estar prá lá de Bucelas. Pois não é que o vinho, um Quinta do Monte d'Oiro Vindima de 7 de Outubro Viognier 2003 não só estava fabuloso como foi o melhor de todos os rótulos da tarde! Com uma cor de âmbar, uma acidez improvável e do alto de seus 15% de álcool saiu derrubando todos as garrafas que estavam por perto. Esse vinho, dessa mesma safra, está à venda na Mistral. Se a carteira estiver cheia, não hesite, mesmo ele custando 189 reais...
No outro extremo da degustação, ao final, eu que tenho por princípio não beber doçuras, não resisti ao Cossart Gordon Terrantez Madeira 1977, com tanta acidez que eu até esquecia que era um vinho doce. Espetáculo!
E entre o primeiro e o último, desfilaram rótulos extraordinários que marcaram nos recônditos da memória essa tarde inesquecível. Pena que acabou...
Oscar Daudt
23/02/2013 |