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Uma denominação problemática
Na segunda-feira, eu havia sido convidado para um almoço de apresentação dos Cavas da vinícola espanhola Raventós i Blanc, uma das mais prestigiadas produtoras do Penedés. Por coincidência, a manchete do dia na Decanter.com era a proposta dessa empresa para a criação de uma nova denominação para classificar seus espumantes. Li tudo com muita atenção para ter um bom assunto no encontro. E acertei na mosca, visto que esse é o tema de maior interesse da vinícola, que dorme e acorda só pensando nisso.

Há alguns meses, a Raventós i Blanc, insatisfeita com a liberalidade da denominação Cava, simplesmente saltou fora do consórcio. E suas próximas safras não exibirão essa denominação no rótulo. Vamos combinar que é um ato de pura coragem, visto que o nome Cava, apesar de todas as polêmicas, é um dos apelidos de espumantes mais conhecidos no planeta: há os Champagnes e depois os Cavas.

O grande problema com essa denominação é o seu clima de vale-tudo. Não consigo lembrar de outra denominação no mundo em que as áreas autorizadas estejam espalhadas pelos diversos cantos de um país, assim como é a DO Cava. Embora 85% da produção desse espumante esteja concentrada no Penedés, é possível plantar e elaborar esses vinhos em lugares tão díspares e distantes como Aragón, Navarra, Rioja, Extremadura e Valencia, dentre outros.

E as grandes marcas espanholas, como a Freixenet e a Codorniú não se avexam em plantar uvas nessas outras regiões, transportá-las para o Penedés e vendê-las sob o nome de Cava, pois é tudo legal. Estimativas apontam que a produção da Freixenet é de assustadores 160 milhões de garrafas ao ano, enquanto a Codorniú ultrapassaria os 100 milhões. Em contraste, a Raventós i Blanc que foca sua produção na qualidade, elabora apenas 600 mil garrafas, o que significa menos de 0,4% da Freixenet.

Em termos de castas, a largueza também é grande. Engana-se quem pensa que os Cavas podem ser elaborados apenas com as mais difundidas Macabeo, Xarel-lo e Parellada. Na verdade, diversas outras variedades são permitidas, tais como Garnacha, Monastrell e até mesmo as internacionais Chardonnay e Pinot Noir.

Cava 2.0
A nova denominação proposta pela Raventós i Blanc pretende estabelecer critérios bem mais restritivos. O primeiro - e mais lógico deles - é a determinação de uma pequena área contígua, situada na parte leste do Penedés, entre os rios Anoia e Foix.

Em termos de produção, o controle começa pelo preço pago aos produtores. Enquanto a DO Cava paga em média €0,20 pelo quilo da uva, a nova denominação fixará que o valor mínimo deve ser de €1/kg. Os vinhedos deverão ser orgânicos e com idade mínima de 10 anos. O rendimento, no entanto, terá uma queda pouco significativa, passando dos 12.000kg/ha para 10.000kg/ha.

O processo de vinificação também terá regras mais rígidas e o tempo mínimo de estágio sobre as lías dobrará de 9 para 18 meses.

Em relação às castas, há uma controvérsia que não consegui desvendar. Enquanto o proprietário Pepe Raventós declarou à Decanter que apenas variedades autóctones poderão ser utilizadas, o diretor comercial da vinícola, Arnau Roca, que comandava o almoço, informou que a Chardonnay poderá ser uma das castas autorizadas pela nova denominação.

Um nome esquecível
No entanto, a denominação proposta já começa perdendo - e feio - em um quesito: o nome! Enquanto Cava é extremamente comunicativo, curtinho e fácil de pronunciar em qualquer língua, a nova denominação apela para o exótico catalão e sugere identificar o novo espumante como Conca del Riu Anoia (Vale do Rio Anoia). Pelo amor de Deus, quem vai conseguir lembrar dessa esquisitice? Talvez seja fácil na Catalunha, mas para quem quer atingir o mercado internacional, não poderia ter feito uma escolha mais infeliz.

Alguém consegue imaginar um consumidor chegando ao restaurante e pedindo: "Me dá um Conca del Riu Anoia?" Nunquinha! Nem princípio ativo de medicamento consegue ser menos comunicativo...

Oscar Daudt
20/03/2013
Os vinhos
Raventós i Blanc Cava Reserva Brut 2008
Castas: 50% Macabeo, 30% Xarel·lo e 20% Parellada
Álcool: 12%
Produção: 400.000 garrafas
Preço (PF): R$104,50
Raventós i Blanc Cava De Nit Rosé 2009
Castas: 50% Macabeo, 25% Xarel·lo, 20% Parellada e 5% Monastrell
Álcool: 12%
Produção: 191.000 garrafas
Preço (PF): R$125,40
Raventós i Blanc Cava La Finca 2006
Castas: 40% Xarel·lo, 25% Macabeo, 20% Parellada, 10% Chardonnay e 5% Pinot Noir
Álcool: 12%
Produção: 75.000 garrafas
Preço (PF): R$169,05
(foto de divulgação)
Raventós i Blanc Cava Elisabet Raventós 2005
Castas: 63% Xarel·lo, 25% Macabeo, 30% Chardonnay e 7% Monastrell
Álcool: 12%
Produção: 34.000 garrafas
Preço (PF): R$203,50
Raventós i Blanc Silencis 2010
Castas: 100% Xarel·lo
Álcool: 12,5%
Preço (PF): R$116,40
Raventós i Blanc Perfum de Vi Blanc 2009
Castas: 60% Macabeo e 40% Muscat de Frontignan
Álcool: 11,5%
Preço (PF): R$83,90
O almoço do Bazzar
Carpaccio de pato com queijo de cabra e tomilho Mix de brotos verdes com feijão manteiga de Santarém e tomates frescos ao vinagrete de caju Lascas de bacalhau confit com pesto de coentro
Namorado grelhado ao pesto sobre arroz de sete grãoes e perfumes cítricos Escalopes de cavaquinha sobre purê de aipim, alho-poró crocante e molho adocicado de amêndoas e avelãs Mini-sobremesas
Os participantes
Stefano Zannier, consultor da Decanter
Arnau Roca, diretor comercial da Raventós i Blanc Isabela Söhnchen
Marcelo Copello, da revista Baco A produtora Lou Bittencourt Sommelier Valmir Pereira, do La Fiducia
As sommelières Gabriela Teixeira e Márcia Alpaes, da Bottega del Vino Sommelier Elvis Baltar, do Iate Clube, e Luciene Albuquerque Sommelière Mônica Alves
A assessora de imprensa Fernanda Fonseca Fernando Burani e Luciano Mayworm, do Alloro Paul Medder, do Aprazível
Cristina Graça Couto, do Margutta Marcelo Souza, do La Fabrique
Comentários
Renato Frascino
Enófilo
São Paulo
SP
20/03/2013 Oscar, degustar borbulhas elegantes e com enorme tipicidade de sua origem, o prazer vai além do sensorial...

Acabamos de apreciar estes verdadeiros néctares aqui em SP. Os franceses que se cuidem.

Renato
Anselmo Federico
Enófilo-ABS
Rio de Janeiro
RJ
21/03/2013 Grande Oscar,

Qualquer marqueteiro iniciante chamaria de Cava Anoia ou qualquer denominação especifica da área sem perder a marca CAVA.

Não vi na matéria comentário quanto à qualidade dos produtos. Ou eles dispensam comentários?

Os produtos são excepcionais, dentre os melhores Cavas espanhóis. Mas eu preferi concentrar a matéria nessa nova D.O. que me pareceu mais instigante.

Abraços, Oscar
Rafael Mauaccad
Enófilo
São Paulo
SP
25/03/2013 Oscar,

Afastar-se da manada será ficar exposto aos predadores. A luta pela sobrevivência faz-se em agrupamentos fortes e agressivos, com estratégia. Decisão de altíssimo risco empresarial, o afastamento da DO Cava, que foi tomada pela direção da Raventos i Blanc. Seu contingente de 600.000 integrantes será irrelevante no enfrentamento de 240.000.000 de oponentes. É morte assistida!

Noticia postada em 22/03 pela Decanter.com, "Cava exports at record high in 2012", ilustra como esta luta será desigual. Clique aqui para ler.

Abraços.
Carlos Stoever
Advogado
Porto Alegre
RS
04/04/2013 Concordo com o Rafael! Como todos sabem, dentro de qualquer DO/AOC existem vinhos e vinhos...

Claro que aquelas muito pequenas (p. ex. as da Borgonha) conseguem ser a exceção - que, como sempre, confirma a regra.

Talvez o caminho fosse criar uma subdivisão... Porém, importante saber que a legislação espanhola é absolutamente rigorosa - lá, é a lei que define termos como crianza, etc...

Quem conhece a Freixenet lembra do trenzinho que se pega para conhecer seus túneis (cerca de 200km...), e que a remuage é feita automaticamente, em caixas gigantes com centenas de garrafas...

Quanto à Raventos i Blanc, são excelentes os vinhos, e destoam de qualquer outra cava que já tenha experimentado... Frutos, sem dúvidas, do carinho artesanal dedicado aos vinhos...

Ah! Sem demérito à Freixenet...
EnoEventos - Oscar Daudt - (21)9636-8643 - [email protected]