
Nas Bodegas Torres, o estatuto determina que, ao alcançar a idade de 71 anos, o presidente deve se retirar e abrir espaço para a nova geração. Então, ao atingir a idade limite, em 2012, o lendário Miguel Torres, depois dos 21 anos à frente da empresa, quando a transformou em uma das mais importantes vinícolas familiares do mundo, anunciou que iria se aposentar e desfrutar da tranquilidade de uma vida sem maiores responsabilidades, passando o bastão adiante.
Miguel Torres Maczassek, o filho, que desde 2010 comandava a vinícola chilena do grupo, retornou então à Espanha e foi nomeado para a direção mundial. E esteve esta semana no Rio de Janeiro, em sua primeira visita como o todo-poderoso da Torres. Mas aquele que nos visitou agora foi exatamente a mesma pessoa acessível e afável que aqui esteve em 2011. A nova posição não lhe subiu à cabeça.
Com uma indisfarçada ponta de orgulho, o novo Miguel nos contou que, apesar de aposentado, o pai continua mantendo sua rotina de bater o ponto na vinícola, incansavelmente, todos os dias. E o novo presidente, demonstrando sua sabedoria, considera o pai como seu melhor conselheiro e submete a ele as decisões mais importantes.
Foi um almoço prá lá de especial, daqueles em que tudo funciona à perfeição, este que foi oferecido à imprensa carioca pelo novo presidente, no restaurante Cipriani, no Copacabana Palace. Na grande mesa, comandada pelo poderoso chefão, a conversa fluia fácil e divertida; o chef Nicola Finamore, em tarde iluminada, apresentou pratos inesquecíveis, que faziam a justa moldura para os vinhos. E, esses, soberbos, não paravam de encher nossas taças...
A festa começou com o espumante Santa Digna Estelado Rosé, o único chileno a ser servido durante o almoço. Esse vinho foi uma aposta audaciosa do novo presidente, durante sua temporada sul-americana, pois é elaborado com a desprezada casta País, historicamente utilizada no Chile para a produção de vinhos de grande volume. Mas a empreitada foi um sucesso e o inesperado vinho já arrebatou, por dois anos, no Wines of Chile Awards, o prêmio de melhor espumante daquele país, para o desespero da concorrência. O Estelado foi assunto de uma matéria do EnoEventos, ano passado, que pode ser lida clicando aqui.
La luz cayó sobre las laderas, y de las piedras nacieron vides entonces cantaron "salmos"
Rótulo do Salmos de Miguel Torres Maczassek |
Desviando-nos para a Espanha, chegou o sempre espetacular Torres Milmanda 2008, um Chardonnay de fina estampa, elegante, equilibrado, que estagia por 10 meses em carvalho francês e tem toda a pinta de quem vai trazer ainda mais alegrias se o deixarem repousar por alguns anos. Isto é, se alguém conseguir resistir...
Além de produzir vinhos no Chile e na Califórnia, as Bodegas Torres estão presentes nas mais importantes denominações espanholas, como Rioja, Ribera del Duero, Rías Baixas, dentre outras. E estão presentes, também, na minha denominação espanhola preferida, o enigmático Priorato, terra de vinhos poderosos, espessos, impenetráveis e... caríssimos. E foi diretamente de lá que veio o próximo vinho, o fabuloso Torres Salmos 2010. O preço é de 180 reais, mas comparado com os inatingíveis rótulos dessa região que brotam em nosso mercado, pode até parecer uma barbada. É um vinhaço que me levou a imaginar as maravilhas que o tempo vai operar com ele. Mas como o que importa é o presente, a harmonização com um risoto de trufas negras não poderia ter sido melhor escolhida. Só mesmo recitando salmos em agradecimento...
O gran finale do almoço - ou melhor, do "meu" almoço - foi um dos principais estandartes das Bodegas Torres, desfraldado sempre que a vinícola deseja conquistar seus convidados: o Torres Mas La Plana 2009, o rótulo que lançou a empresa no cenário internacional, ao vencer as Olimpíadas do Vinho de Paris de 1979, soterrando concorrentes com nomes bem mais cultuados. Elaborado com 100% de Cabernet Sauvignon, impressiona pelos aromas marcadamente florais, pelos condimentos e pelas frutas negras que abrem alas para um corpo poderoso e aveludado. É outro vinho que merece repousar - e muito - na adega.
Oscar Daudt
15/09/2013 |