
Em 2010 e 2011, o respeitado guia Gambero Rosso publicou, além da prestigiada lista dos Tre Bicchieri, uma categoria especial, os Tre Bicchieri Plus, que selecionava, dentre os vinhos com as 3 tacinhas, aqueles que eram a Escolha do Editor. Na prática, eles criaram uma categoria superior - digamos, os Quattro Bicchieri - e relegaram a tradicional e cobiçada classificação máxima a um segundo plano. Foi uma medida infeliz, um tiro no pé e teve vida curta, pois já em 2012, essa categoria desapareceu do guia. Mas os escolhidos ficaram com a honraria de terem sido os únicos vinhos a receberem as 4 tacinhas na história do Gambero Rosso.
Bem, mas eu conto essa história toda só para dizer que, na edição 2011, o espumante Giulio Ferrari Riserva del Fondatore Brut 2001, fez parte dessa exclusiva escolha. E foi exatamente esse excepcional espumante que fechou o almoço de fim-de-ano promovido pela importadora Decanter, no Satyricon, em Ipanema. Um momento inesquecível!
A história da Cantine Ferrari começa em 1902, quando Giulio Ferrari, um enólogo visionário, decide iniciar uma produção de espumantes no Trentino, norte da Itália, inspirado em visita que havia feito à região de Champagne. Sua produção era pequena, a partir das melhores uvas e com preços exorbitantes para a época. Quando, 50 anos depois, ele vendeu sua vinícola para Bruno Lunelli, proprietário do mais famoso bar de vinhos de Trento, sua produção era de apenas 10.000 garrafas ao ano!
A família Lunelli, com espírito mais empreendedor, decidiu manter a qualidade que fazia a fama da cantina, continuar a elaborar apenas espumantes pelo método clássico, mas aumentando a produção, paulatinamente, até atingir, nos dias atuais, a poderosa marca de 4,5 milhões de garrafas. Embora o número impressione, quando se compara com a produção de cada uma das maiores casas de Champagne, com cerca de 30 milhões de garrafas ao ano, é quase um suspiro.
Não é fácil disputar mercado com a região francesa, mas a relativamente pequena Ferrari é como um Dom Quixote, lutando sozinha contra os grandes moinhos. E usa das mesmas armas dos franceses, sendo patrocinadora de eventos de expressão mundial, tais como o Oscar - não eu, e sim o prêmio de Hollywood - e o Nobel. Mas, enquanto a região de Champagne cobra um preço extra apenas pelo nome, a vinícola do Trentino tem mesmo é de entregar qualidade. Vale a pena fazer um teste às cegas entre exemplares de preços similares das duas regiões para tirarem suas próprias conclusões. Depois me contem...
É claro que nessa luta, a vinícola conta com a ajuda divina de possuir uma marca fortíssima. Embora não tenha parentesco com a poderosa fábrica de automóveis de Maranello, tira uma casquinha do icônico nome, sinônimo de luxo e exclusividade por todo o planeta.
Quatro garrafas e um demi-sec |
A combinação dos espumantes Ferrari com a cozinha do Satyricon foi uma escolha campeã. Parece até que nasceram um para o outro. Enquanto os imbatíveis frutos do mar do restaurante se sucediam em nossos pratos, os espumantes seguiam uma trajetória de qualidade - e gostosura - crescentes em nossas taças. Os muitos convidados - imprensa, lojas e restaurantes - não escondiam a satisfação por estarem participando de um evento tão especial.
Os espumantes da casa caracterizam-se pelos longos tempos de autólise com que são elaborados. O Ferrari Maximum Rosé, corte de Chardonnay e Pinot Nero, por exemplo, passa pelo menos 3 anos maturando; o Ferrari Perlé Brut 2005, pelo menos 5 anos; já o Ferrari Perlé Nero 2004 dorme no mínimo 6 anos nas caves. Mas o mais impressionante é o topo de linha, o Giulio Ferrari Riserva del Fondatore 2001 - aquele dos Quattro Bicchieri - que é esquecido por 10 anos com as leveduras. No mínimo isso, já que o exemplar que nos foi servido só deixou a companhia das borras depois de 12 anos. Incrível! Um vinho poderoso...
Ao final, ainda teve um Ferrari Demi-sec. Sem palavras...
Oscar Daudt
27/11/2013 |