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Decanter

Agricultura de resistência
Santorini, no mar Egeu, é um dos destinos mais procurados pelos turistas nas ilhas gregas, com seu casario pintado de branco situado no topo de um impressionante penhasco de 400 metros de altura. A ilha, conforme a conhecemos hoje, é o que restou de uma violenta explosão vulcânica ocorrida por volta do ano de 1600 AC, e pode-se claramente conferir, na foto de satélite à direita, que ela é o contorno de uma cratera submersa.

A tradição vinícola da ilha começa bem antes do cataclismo, com registro de cultivo de vinhas por volta do ano de 5000 AC. Mas foi mesmo a explosão que moldou o caráter dos vinhos de Santorini como eles existem atualmente. Seu solo - conhecido como aspa - é composto de cinzas vulcânicas, pedra-pomes, lava solidificada e areia, sem praticamente nenhuma matéria orgânica.

Os vinhedos são treinados no método "Koulara", que consiste em enrolar as vinhas em círculos contínuos, em formato de cestas (foto à esquerda), a fim de protegê-las dos fortes ventos e do sol escaldante do verão. Com o passar dos anos, os nutrientes têm de percorrer um caminho cada vez mais longo nessas plantas espiraladas e o rendimento cai de forma dramática. A solução é, então, cortar a "cesta" a nível do solo, o que faz com que uma nova vinha desponte das velhas raízes. Em média, esse procedimento é realizado a cada 75 anos, e como nos últimos séculos sabe-se que cada planta já passou por 4 ou 5 podas, a idade dos vinhedos é de cerca de 300 anos!.

No entanto, o cultivo das vinhas vêm diminuindo na ilha. Em 1960, havia 2.500 hectares de vinhedos e, atualmente, esse número baixou para perto de 1.400 hectares apenas, o que é debitado às dificuldades de cultivo, que faz as novas gerações preferirem outras atividades econômicas e também ao extraordinário desenvolvimento do turismo na ilha, fazendo disparar o preço da terra e ameaçando a sobrevivência de uma cultura vinícola tão ancestral quanto original.

Casta de alta qualidade
É nesse cenário que reina absoluta a casta Assyrtiko, uva branca que representa 70% do total dos vinhedos da ilha. É uma variedade que tem a capacidade de obter elevados níveis alcoólicos e ao mesmo tempo preservar uma alta acidez, possibilitando que tenha um grande potencial de guarda.

Jancis Robinson, fanzoca da casta, assim a descreve: "Uva de alta qualidade, intensa e de grande estrutura que conserva a acidez mesmo com o calor". É tudo o que se deseja em uma casta branca, não é mesmo? Combinada com o solo vulcânico de Santorini, seus vinhos são nada menos do que apaixonantes.

Os vinhos de Assyrtiko são normalmente monovarietais e sem passagem em madeira. No entanto, alguns produtores se arriscam no estágio em carvalho. É também comum a elaboração de um vinho de sobremesa com a casta, normalmente cortada com Athiri e Aidani.

Com ou sem madeira?
Para tirar a teima sobre o efeito do uso da madeira no vinho, decidi fazer uma prova de dois exemplares de uma mesma vinícola, um sem, e outro com, passagem em carvalho. O produtor escolhido foi o Domaine Sigalas, trazido pela importadora Decanter, e os dois vinhos foram o Santorini Assyrtiko 2012 e o Santorini Assyrtiko Fermented in Oak Barrel 2010.

Em comum, as duas garrafas têm a casta - 100% Assyrtiko - a denominação, sendo ambas DOC Santorini e uma boca seca, apresentando baixo açúcar residual (1,5 e 1,8g/l). O teor alcoólico é bastante alto, apresentando valores mais comumente encontrados em Amarones, 15% e 14,7%, mas que não passam de meros detalhes no harmonioso conjunto. E, finalmente, também em comum, ambos são deliciosos...

O primeiro dos vinhos é fermentado em aço e não vê nem a cor da madeira. Seus explosivos aromas frutados, minerais, oferecem muitos cítricos, flores brancas, abacaxi e alecrim. Na boca é impactante, com textura quase oleosa, excelente frescor, de uma intensidade ímpar e uma permanência sem fim.

Já o segundo vinho, fermenta e estagia por 8 meses em uma milimétrica divisão de barricas: 25% novas, 25% de primeiro uso, 25% de segundo uso e os 25% restantes em barricas de terceiro uso. Os primeiros aromas trazem a madeira com grande clareza e os aromas de canela, coco e chocolate branco estão lá para provar. Mas aos poucos vão surgindo os toques frutados e, principalmente, um surpreendente eucalipto. O resultado dessa mistura de aromas é extraordinário e, como um pivete com sua lata de cola, eu não conseguia tirar o nariz da taça. Foi uma experiência extra-terrestre!

E qual foi o que eu mais gostei? Logo no início da prova, a resposta parecia simples: a explosão de frutas e minerais do vinho sem madeira dava de dez no caráter amadeirado do outro. Mas depois do 32º gole, quando a fruta e o eucalipto tomaram conta da taça do segundo vinho, eu balancei. E vou adotar uma resposta diplomática: "os dois são grandes vinhos!".

Oscar Daudt
16/04/2014
Os vinhos
Santorini Assyrtiko 2012
Produtor: Domaine Sigalas
Denominação: DOC Santorini
Castas: 100% Assyrtiko
Álcool: 15%
Preço: R$127,60
Santorini Assyrtiko Fermented in Oak Barrel 2010
Produtor: Domaine Sigalas
Denominação: DOC Santorini
Castas: 100% Assyrtiko
Álcool: 14,7%
Preço: R$164,70
As belas cores dos vinhos: o da direita é o barricado

Comentários
Pierpaolo Penco
Wine marketing manager
Friuli
Itália
16/04/2014 Ciao Oscar,

I visited Sigalas winery in Santorini 3 years ago: what a great experience! His wines, as well as the wines by Hatzidakis are, in my opinion, some of the best white wines in the world.

I tasted a lot of wines from Santorini during a holiday week (you can read the post on my blog by clicking here) and I discovered a true treasure for wine lovers.

So I am glad you had the opportunity to taste the salty, vulcanic minerality of Assyrtiko ;-)

Best
Pierpaolo
Eugênio Oliveira
Enófilo
Brasília
DF
16/04/2014 A mineralidade desses vinhos, principalmente no sem madeira, é maravilhosa.

E as cores, com fundo claro, ficam bem mais salivantes...

Abç
Guilherme Corrêa
Sommelier
Blumenau
SC
16/04/2014 Caro Oscar,

Estes são os vinhos que balançam a gente, não é mesmo?

O Paris Sigalas é um monstro, um homem muito simples mas de um cabedal que honra os gregos de outrora. Matemático formado em Sorbonne, artista, dramaturgo, filólogo e arqueologista de uvas autóctones de Santorini. Seus assyrticos são dos vinhos mais minerais do mundo, lava refrescante de vulcão...

Forte abraço!
Celso Caron
Empresário
Curitiba
PR
16/04/2014 Alo Oscar Daudt,

Gostaria de saber onde posso adquirir esses nectares.

Cordialmente
Celso

Celso, quem importa esses vinhos é a Decanter. Pela internet, você pode comprar na página deles (www.decanter.com.br). Em loja, você encontra nas Enotecas Decanter: eu vi que aí em Curitiba tem uma no Batel (Av. Visc. de Guarapuava, 5154) e outra no Barigui (R. Padre Agostinho, 2960). Abraços e depois me conte o que você achou. Oscar
Jorge Alonso
Contando Vinhos
Rio de Janeiro
RJ
16/04/2014 Oscar,

A Assyrtiko é realmente apaixonante e quanto ao Sigalas não é a toa que consideram ele o grande produtor dessa uva. Visitei a Domaine Sigalas ano passado, quando estive em Santorini, se você gostou desses Assyrtiko experimente o Kavalieros (pena que seja tão caro), provenientes de vinhedos em um dos pontos mais altos da ilha.

Mas o melhor vinho dele, em minha opinião, não vem para o Brasil e é o Nychteri, poucas vezes bebi um vinho desse nível.

Se lhe interessar envio em anexo um link para meus comentários sobre a visita ao Domaine Sigalas: clique aqui.

Tinha um post sobre um Assyrtiko na fila que resolvi postar hoje também: clique aqui.

Abraço,
Jorge Alonso

Pois é, Jorge, eu achei o Kavalieros muito caro e não tive coragem de comprar para esta prova. Mas agora que eu gostei tanto dos outros dois, talvez eu me dê de presente.

Muito obrigado pelos links. Já visitei seu blog e achei muito bacana.

Abraços, Oscar
Ramon Justino
Sommelier
Rio de Janeiro
RJ
16/04/2014 Oscar, parabéns pela matéria e Guilherme pela escolha.

Estes são os tipos de vinhos que realmente conferem autenticidade à uma Carta de Vinhos e ao Portfólio da Decanter. Assim que possível, irei prová-los para futura inserção na Carta.

Obrigado pela lembrança deste renomado produtor!

Abs!
Reinaldo Paes Barreto
Enófilo de carteirinha
Rio de Janeiro
RJ
20/04/2014 Beber um Assyrtiko sem madeira é sorver uma Petrobras sem escândalo: o mineral inocente, salivando na boca, quase um vinho verde sem agulhas. Uma experiência! O 2010, então, ótimo!
EnoEventos - Oscar Daudt - (21)99636-8643 - [email protected]