
Em 2011, Marcelo Retamal, o premiado enólogo da chilena De Martino, esteve no Rio de Janeiro e declarou, surpreendentemente, não gostar dos vinhos que então elaborava, prometendo dar uma virada estilística, conforme bem relatado à época por Alexandre Lalas, em sua coluna no EnoEventos (clique aqui para recordar).
Marcelo reclamava dos vinhos da De Martino - assim como de toda a indústria vinícola chilena - por serem muito concentrados, potentes, alcoólicos e com excesso de madeira. E eu acredito que é necessário "ter aquilo roxo" para nadar contra a corrente de uma indústria poderosa, que vende mundo afora - e muito! - os vinhos que acertam o gosto da esmagadora maioria dos consumidores, que apreciam o estilo dito parkerizado.
Mas o enólogo prometeu e cumpriu!
Esta semana, de volta ao Rio de Janeiro, Marcelo apresentou sua coleção de vinhos da linha Single Vineyard, que fogem dessa padronização. Foram 8 rótulos (um deles, o Syrah, eu não tive a chance de provar) francos e agudos, que chegam para mostrar que são feitos de uvas e não de química.
O grande enólogo, em sua apresentação, desfralda muitas bandeiras do "vinho natural" e revolta-se contra a maquiagem dos produtos. Reclamou da utilização de leveduras cultivadas, que ajudam a definir o estilo de um vinho: "Você quer um vinho com aromas cítricos, use a levedura A; prefere aromas florais, use a levedura B...". E contou que as abandonou, em definitivo, para a elaboração de seus vinhos, deixando a natureza fazer seu trabalho.
A utilização excessiva da madeira também é condenada, pois Marcelo a considera uma intervenção inaceitável. E em seu novo estilo, o uso de barricas fica limitado àquelas que já tenham muita quilometragem ou aos grandes tonéis usados de 5.000 litros.
Conforme suas palavras, a De Martino, vetusta empresa familiar que ora completa 80 anos, soube se reinventar e define o novo estilo de vinhos como "sentido de lugar, pureza e essência gastronômica". É a elegância derrotando a força.
Os vinhos são encantadores, diretos, leves e frescos e conquistaram os participantes do evento. A crítica especializada também foi generosa e o Guia Descorchados atribuiu a toda a linha, sem exceção, pontuação de 94 ou 95 pontos!
Mas e a grande maioria dos consumidores, acostumada com a potência, a madeira e os altos teores alcoólicos? Qual será sua aceitação a esse novo estilo de vinhos chilenos? É uma aposta e tanto!
Só o tempo - e as vendas - dirão...
Oscar Daudt
24/10/2014 |